Título: Calçados perdem competitividade
Autor: Vera Dantas
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/02/2006, Economia & Negócios, p. B30

Segundo fabricantes, câmbio deve fazer com que 50 milhões de pares deixem de ser exportados este ano

A indústria de calçados brasileira poderá deixar de exportar este ano 50 milhões de pares de calçados por causa da desvalorização do dólar frente ao real. A previsão é da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados) que voltou a cobrar ontem do governo medidas para reduzir o impacto do câmbio no setor. Segundo a associação, em 2005 já deixaram de ser exportados 23 milhões de pares.

Além da perda com exportação, a quantidade de sapatos importados, principalmente da China, também deve dobrar este ano, chegando a 35 milhões de pares. 'Somada a redução das exportações à entrada dos importados, deixarão de ser produzidos no País em 2006 entre 80 milhões e 85 milhões de pares', diz o presidente da Abicalçados, Élcio Jacometti. Com este cálculo ele estima que 25 mil empregos serão perdidos.

Os representantes do setor já se reuniram em dezembro com o presidente da República e ministros e, depois, duas outras vezes em janeiro com técnicos do governo para buscar medidas emergenciais. Entre as reivindicações do setor está a criação de uma linha de crédito nova e específica para capital de giro, com recursos do BNDES. O financiamento teria juros menores e pagamento de longo prazo, para compensar perdas com o câmbio.

Mas nada foi feito e Jacometti diz que está frustrado. 'Queremos que o governo nos diga qual é a sua posição diante do setor, pois assim vamos tomar as decisões que melhor se aplicam ao negócio calçados', diz.

Essas decisões incluem deixar de produzir e passar a importar ou fabricar em outros países, como já vem ocorrendo por parte de algumas empresas. 'Não houve avanço significativo nas reuniões,' diz o diretor executivo da Abicalçados, Heitor Klein. Ele já identificou várias movimentações de fabricantes para reduzir custos e não perder mercado. Entre elas, a transferência de empresas do Sul para o Nordeste e a importação da China pelo fabricante para vender tanto no Brasil como em outros mercados. 'Há também empresas com planos de instalarem a produção em outros países, como Argentina, Bolívia, China e até na Namíbia, na África, por causa da mãode-obra mais barata', diz.

Até o fim de 2005, mesmo com perdas na carteira, as empresas conseguiram reajustar em 17%, em média, os preços dos calçados no mercado externo e equilibrar o faturamento, de acordo com o presidente da Abicalçados. 'Mas em janeiro a situação já mudou e tivemos uma queda de 11% nas importações em pares e de 7% no faturamento', diz Jacometti.

Ele observa que não é possível um repasse maior porque os outros países têm preços mais competitivos. O descontentamento aumentou quando o BNDES decidiu liberar recursos para pequenas e médias empresas apenas para a compra de máquinas. 'Não queremos importar equipamento, precisamos de dinheiro para produzir', diz Jacometti.