Título: Corte francesa valida lei do emprego
Autor: Reali Júnior
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/03/2006, Internacional, p. A14

Os nove membros do Conselho Constitucional, o supremo tribunal da França, decidiram validar sem reservas o texto da polêmica lei que institui o Contrato Primeiro Emprego (CPE ). Essa lei reduz direitos trabalhistas por um período de dois anospara estimular as empresas a contratarem jovens menores de 26 anos e é rejeitada por grande parte dos estudantes franceses. Segundo os juízes, não existe na lei, tanto em relação ao conteúdo quanto à forma, nada que possa contrariar os dispositivos constitucionais. Esse parecer foi recebido com grande alívio pelo primeiro-ministro Dominique de Villepin. Isso porque a conclusão do tribunal justifica a posição de intransigência adotada por ele na defesa do CPE - do qual ele se considera o grande artífice.

O recurso contra o CPE partiu da oposição socialista, que, com a decisão do supremo, aumentou o número de derrotas frente ao governo, deixando Villepin satisfeito.

Hoje, o presidente Jacques Chirac, ao que tudo indica, deverá sancionar a lei, antes de se dirigir à nação pela TV. Isso apesar de ter prazo de 9 dias para a promulgação. Ele pode também anunciar a convocação de uma cúpula que reuniria governo, centrais sindicais e entidades estudantis - a exemplo do que ocorreu em maio de 1968 com o Pacto de Grenelle.

Naquela época, os chamados parceiros sociais - sindicatos, empresariado e governo - sentaram-se ao redor da mesma mesa no Ministério do Trabalho. E decidiram debater uma série de medidas que resultaram num substancial aumento do salário mínimo e de outras formas de remuneração. Contudo, desta vez, não se trataria de fixar reajustes salariais, mas de estabelecer uma reforma social que permitiria substituir com rapidez o Contrato Primeiro Emprego, rejeitado pelos sindicatos e entidades estudantis.

A proposta desse novo Grenelle social , anunciada oficiosamente por setores ligados ao presidente francês, pouco contribuirá para acalmar a cólera dos que se opõe à iniciativa do governo. As centrais sindicais já deixaram claro que não vão aceitar essa eventual oferta de Chirac. Seus dirigentes continuam fazendo grande pressão sobre o chefe de Estado para que não sancione a lei. Villepin, por sua vez, também já alertou o presidente. Ele renuncia ao cargo se Chirac, que apóia a iniciativa, ceder às pressões e suspender a lei ou modificar seu texto original. Villepin é homem de absoluta confiança de Chirac e candidato dele às eleições presidenciais de 2007. Se Villepin abandonar o governo por qualquer motivo, Chirac enfrentaria o que os analistas classificam de "fim de mandato desastroso".

A ordem transmitida pelo ministro da Educação, Gilles de Robien, aos reitores para que chamassem a polícia para liberar os edifícios ocupados por estudantes não chegou a ser cumprida. Os CRS, como são chamadas as tropas de choque, continuaram agindo com prudência. Obedecem ordens do ministro do Interior, Nicolas Sarkozy, que está participando de uma reunião de partidos europeus em Roma. Sarkozy, que também postula a candidatura à presidência, e seus aliados não estão satisfeitos com a possibilidade de promulgação do CPE. Aconselham Chirac aproveitar o prazo de nove dias para tentar negociar uma saída para a crise.

Por enquanto, a manifestação e a greve nacional da próxima terça-feira anunciada pelos sindicatos e estudantes estão mantidas. Os partidos de oposição também continuam fazendo pressão sobre o presidente. O deputado François Hollande , primeiro secretário do Partido Socialista, teme que , agora, possa ocorrer um confronto. A oposição adverte para o risco político provocado pela tensão social. Avisa o governo de que de ele pode transformar estudantes frustrados em adversários políticos.