Título: Golpe em holandeses acabou levando cultura ao Nordeste
Autor: Fernando Dantas
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/03/2006, Economia & Negócios, p. B8,9

Casal queria cultivar em Mato Grosso do Sul, e acabou no Maranhão

A história da soja no Maranhão começou com um golpe aplicado no casal de imigrantes holandeses Leonardus Josephus Philipsen e Wilhemina Antonia Stapelbroek , que chegaram ao Brasil em 1949, separadamente, antes de se conhecerem. Tanto Leonardus, que tinha 26 anos quando aportou em Santos, quanto Wilhemina foram trabalhar na fazenda Holambra, de 5 mil hectares, em São Paulo, transformada hoje em município. Os dois vieram ao Brasil na leva de imigrantes holandeses fugidos da penúria do pós-Guerra, e chegaram ao País sem dinheiro ou conhecimento do português.

O casal, que teve quatro filhos, trabalhou sempre na agricultura, em diversas localidades em São Paulo, Rio Grande do Sul e Mato Grosso do Sul. Neste último Estado, já nos anos 70, compraram terras na divisa com Minas Gerais. Quando tentaram legalizar a escritura, descobriram que a propriedade estava ¿sub judice¿ e que não conseguiriam ganhar a posse.

O corretor, que se recusou a devolver o dinheiro, ofereceu, em troca, terras em Balsas, no Maranhão, uma região distante, inóspita, e sem nenhuma tradição de agricultura moderna. Philipsen aceitou, no que foi o início da história da soja no Maranhão e no Piauí.

As dificuldades foram enormes, numa região paupérrima, sem estradas asfaltadas, telefone ou implementos agrícolas básicos como calcário e adubo. Eles começaram com o arroz em 1975, e levaram vários anos até introduzir a soja, com o apoio do pesquisador Alcides Bays, paranaense de Londrina, que chegara à região. A primeira variedade de soja bem adaptada ao cerrado maranhense, desenvolvida com a associação entre Bays e Philipsen, foi batizada de ¿Mina¿, em homenagem a Wilhemina. Em 1984, Bays morreu num desastre aéreo, perto do aeroporto de Imperatriz, maior cidade do Sul maranhense.

Um marco importante para o setor de soja no Maranhão foi o embarque, em julho de 1992, de um carregamento da commodity para a Espanha. A transação inaugurou o chamado Corredor de Exportação Norte, que hoje escoa a produção da região por rodovias e pelas ferrovias Carajás e Norte-Sul até São Luís, onde o terminal portuário de Ponta da Madeira, da Vale do Rio Doce, exportou 1,8 milhão de toneladas de grão e farelo de soja em 2005.

O desenvolvimento da soja no Maranhão e no Piauí continua até hoje, com um processo contínuo de pesquisa de novas variedades e de aprimoramento dos solos.

Um dos atores importantes neste processo é a Fundação de Apoio à Pesquisa do Corredor de Exportação Norte Irineu Alcides Bays (Fapcen), uma instituição sem fins lucrativos, sediada em Balsas, criada em 1993 por produtores para apoiar as pesquisas da Embrapa.

Desde 1998, a Fapcen tem como superintendente a engenheira agrônoma Gisela Introvini, natural de Ponta Grossa, no Paraná. Ela é parte da legião de técnicos que vieram do Sul do Brasil para participar do boom dessa cultura no Nordeste. Gisela chegou a Balsas sem emprego definido, e algum tempo depois recebeu o convite da Fapcen: ¿Vim por mim mesma, para me aventurar numa nova vida nesta região¿, diz.

A superintendente explica que, nos primeiros anos da Fapcen, a região base de operação da entidade, formada pelos Estados do Maranhão, Piauí e Tocantins, era importadora de sementes de outras partes do Brasil. Hoje, depois de grande desenvolvimento técnico, fruto da parceria entre a Embrapa e a Fapcen, os produtores associados à fundação vendem sementes ¿ desenvolvidas principalmente no Maranhão ¿ para 14 Estados, incluindo Mato Grosso, Goiás, Minas Gerais, Pará e Roraima. No momento, alguns dos produtores da região de Balsas estão em negociação para exportar sementes para a Venezuela e a Guiana.