Título: Política fiscal é foco das atenções
Autor: Fernando Dantas
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/03/2006, Economia & Negócios, p. B1,3

Para analistas, campanha eleitoral deve acirrar pressões, mas governo já mostrou disposição de resistir

No mercado financeiro, o grande foco de atenções, às vésperas da possível saída do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, é a política fiscal. Embora as pressões para abrir os cofres públicos sejam fortes, em plena campanha eleitoral, a expectativa é de que o governo resista à tentação. Segundo Alexandre Pavan Póvoa, diretor-executivo da Modal Asset Management, administradora de recursos, "é muito difícil imaginar um cenário em que o governo não cumpra a política fiscal este ano". Ele se refere à meta de superávit primário de 4,25% do PIB.

Póvoa observa que o medo de uma guinada na política econômica foi maior no ano passado, quando as intenções de voto em Lula em pesquisas eleitorais despencaram, na esteira do escândalo do mensalão. O seu raciocínio, comum no mercado financeiro e nos meios empresariais, é de que Lula se mostrou determinado a manter a política econômica mesmo em situações bem mais difíceis, com a crise do mensalão no auge e os juros em níveis bem mais elevados. Os empresários, mesmo nos aspectos que mais criticam na política econômica, como os juros altos e o real valorizado, não esperam mudanças caso Palocci saia do governo.

"Os problemas não serão resolvidos de um dia para o outro por um eventual substituto", diz Miguel Sampol, diretor-geral da Klabin. O executivo aponta o câmbio valorizado como um dos principais problemas da atual política econômica. "Isto nos prejudica e diminui nossa competitividade para exportar, mas acreditamos que é uma tendência que vai se manter no médio prazo."

Outros empresários responsabilizam Palocci diretamente pelos efeitos negativos da política econômica, mas ainda assim não nutrem esperança de que a sua saída trará mudanças. Roberto Nicolau Jeha, presidente da São Roberto, fabricante de papel ondulado, um duro crítico da política de juros do Banco Central (BC), diz que gostaria que Palocci "fosse substituído por um ministro desenvolvimentista, que tivesse um projeto de Brasil, e não agradasse apenas ao mercado financeiro, aos banqueiros e aos rentistas".

Mas ele acrescenta que essa possibilidade é "um sonho de uma noite de verão", e pergunta: "Você acha que o presidente Lula vai correr o risco de perder o apoio dos banqueiros num ano eleitoral?".

Os nomes cogitados para uma eventual substituição de Palocci, naturalmente, estão sendo analisados com lupa pelo mercado financeiro. As preferências recaem sobre Murilo Portugal, secretário-executivo do Ministério da Fazenda, e Paulo Bernardo, ministro do Planejamento. "Se vier uma pessoa de reputação duvidosa, que tenha no passado namorado políticas diferentes, aí o preço de comprar credibilidade é muito mais alto", diz o economista Edward Amadeo.

TRANSIÇÃO

Paulo Leme, diretor de Mercados Emergentes do Goldman Sachs, vê com preocupação a eventual saída de Palocci. Para ele, num ano eleitoral, "haverá maior dificuldade em resistir à pressão política para aumentar os gastos, sem um ministro da estatura política do Palocci".

Outra preocupação é quanto à política econômica num eventual segundo mandato de Lula, com Palocci afastado da cena política. "A grande questão para o mercado é a transição para o próximo governo", diz Póvoa.