Título: 'Banco Central exagerou nos juros'
Autor: Fernando Dantas e Rita Tavares
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/03/2006, Economia & Negócios, p. B6

O economista John Williamson, pai do Consenso de Washington, criticou ontem a ortodoxia da política econômica brasileira. O Consenso de Washington foi o conjunto de reformas liberalizantes proposto, no final da década de 80, como fórmula de desenvolvimento para os países emergentes, especialmente da América Latina, e que virou símbolo da visão neoliberal na economia. Ele participou ontem de um seminário sobre crescimento econômico no centro de convenções Expominas, durante a programação que antecede a reunião anual do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), na próxima semana.

Williamson acha que o Banco Central (BC) exagerou na dose de juros em 2005, e que o governo brasileiro deveria sinalizar claramente que considera o real sobrevalorizado, além de intervir mais no mercado à vista, comprando dólares, para conter a apreciação da moeda nacional. Para ele, uma das precondições para o crescimento é uma taxa de câmbio flexível e competitiva. "A sobrevalorizacão é extremamente perigosa, é preciso tentar contê-la", disse.

Para o economista, que é inglês e trabalha no Instituto de Economia Internacional, em Washington, "o Brasil foi longe demais em seguir tudo o que fazem os países do Norte (países ricos), o que talvez não faça sentido nem para os países do Norte". Referindo-se à área econômica do governo brasileiro, Williamson disse que "eles querem pertencer àquele clube (o pensamento econômico oficial dos países ricos), e então não dizem nada que acham que pode pegar mal no clube".

Williamson admitiu que a compra de dólares teria custos, mas ponderou que traria benefícios para a economia. Em contrapartida a esse aumento de custos, o economista sugeriu que o BC cortasse a taxa de juros. "É muito melhor gastar com a compra de dólares e reduzir custos, com juros menores", afirmou.

Além de defender intervenções no câmbio, Williamson criticou a continuidade de emissões soberanas em dólares. "O governo não tem de fazer empréstimos em dólares. Não entendo por que o governo fez um empréstimo em dólares recentemente. Não faz sentido, para mim. Se quer captar, deve fazer em reais", ele disse.

O economista também criticou a política monetária brasileira. Para ele, o BC perderia a credibilidade no final de 2004 se não tivesse elevado a Selic, a taxa básica de juros, por causa da alta da inflação. Porém, em 2005, "houve um claro exagero", na sua opinião.

Apesar das críticas ao câmbio e aos juros, Williamson fez uma avaliação positiva sobre o desempenho macroeconômico na gestão de Lula. "Nossas preocupações estão no campo microeconômico", afirmou, citando, como exemplo, a dificuldade para a abertura de empresas no País. Para ele, a saída de Antonio Palocci e a nomeação de Guido Mantega para o Ministério da Fazenda não deve provocar mudanças no curto prazo. "O governo Lula fez tanto investimento em uma política econômica responsável. Não acredito que o novo ministro provoque problemas no curto prazo."

A certeza, no entanto, não é a mesma para o longo prazo. Williamson citou a afirmação de Mantega, em sua primeira entrevista coletiva como ministro, de que não está disposto a aumentar a abertura comercial do País, com uma nova rodada de redução de alíquotas de importação que estava nos planos da Fazenda, na gestão de Antonio Palocci. "É esse tipo de coisa que pode impedir o progresso do Brasil", disse.

O economista mostrou preocupação também em relação à continuidade de uma política fiscal consistente que leve à redução da relação entre a dívida líquida do setor público em relação ao Produto Interno Bruto. Ele lembrou que há um consenso entre os economistas que países, como o Brasil, devem ter uma relação de 40% ou 30%, em vez de mais de 50%.

No debate sobre crescimento econômico, o prêmio Nobel de Economia Douglas North defendeu a criação de sistemas de incentivo ao aumento da produtividade, "um dos fatores mais importantes do desenvolvimento".