Título: Os riscos de Congonhas
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/03/2006, Notas e Informações, p. A3

Completamente saturado, sufocado por uma ocupação densa de bairros residenciais nas vizinhanças e cercado por corredores de tráfego de grande movimento, o Aeroporto de Congonhas tem de operar em níveis máximos de segurança. Ali, qualquer acidente assume proporções exageradas - como aconteceu com a derrapagem ocorrida durante a operação de pouso de um avião vindo do Recife, com 115 passageiros a bordo, na tarde da quarta-feira. Chovia forte e o piloto teve de conduzir a aeronave em ziguezagues pela pista até conseguir parar, a poucos metros da Avenida Washington Luís, onde há sempre grande movimento. Ninguém se feriu, mas o episódio motivou troca de acusações e reabriu discussões sobre as condições das pistas e a saturação do aeroporto.

A Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária (Infraero) assegurou que as pistas são seguras e testes realizados para verificar o coeficiente de atrito dos pneus das aeronaves nas pistas comprovam que seguem os padrões de segurança. Desde janeiro, porém, segundo o coordenador da Comissão de Segurança de Vôo do Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias, Ronaldo Jenkins, pilotos de várias empresas aéreas levaram aos seus superiores preocupações e alertas sobre problemas com as pistas do aeroporto que, conforme eles, haviam ficado escorregadias após serviços de recapeamento realizados em 2005.

Um deles informou que durante os trabalhos de conservação da pista não foram feitos os sulcos transversais no asfalto (grooving) para auxiliar no escoamento da água das chuvas. A Infraero garante que o sistema está em perfeitas condições.

Já em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, o engenheiro aeronáutico Ozires Silva classificou a derrapagem do avião como um incidente, numa pista boa, sem problemas de drenagem. "Nem todos os acidentes têm explicações", afirmou.

Por isso mesmo, todas as possíveis causas devem ser consideradas e todas as medidas para evitar tragédias, tomadas. É prudente a decisão da Infraero de analisar, na próxima terça-feira, a possibilidade de reduzir o número de vôos do Aeroporto de Congonhas. A intenção é diminuir o movimento no aeroporto de 600 operações diárias de pousos e decolagens para 400.

Bem faz também o Departamento de Aviação Civil (DAC) - agora Agência Nacional de Aviação Civil -, que decidiu investigar as condições de drenagem das pistas. As observações do diretor de Segurança do Sindicato Nacional dos Aeronautas, Carlos Camacho, precisam igualmente receber atenção. Ele lembra que a pista não tem problema de drenagem, mas sua extensão a torna crítica em períodos de chuvas intensas. Em entrevista ao Estado, lembrou que toda pista com menos de 2 mil metros é considerada crítica, condição que se agrava com chuva forte. A principal de Congonhas tem 1.949 metros. Por isso, ele defende a necessidade de trocar os gramados em volta das pistas por caixas de concreto poroso, que podem auxiliar a parar o avião em situações como a de quarta-feira.

O Aeroporto de Congonhas foi construído na década de 30. Nos anos 80, o movimento chegou a 6 milhões de passageiros por ano. Atualmente, pelo menos 13 milhões de pessoas embarcam e desembarcam ali a cada ano. Em 2003 foram iniciadas obras para adequar o local a esse movimento e, assim, reduzir os transtornos trazidos aos passageiros pela superlotação. A primeira etapa, concluída no ano seguinte, permitiu que o aeroporto ganhasse novas salas de embarque, além de oito pontes de embarque, evitando o acesso a pé até as aeronaves. A área do terminal foi ampliada de 37,3 mil metros quadrados para mais de 51 mil metros quadrados.

Na segunda-feira, será inaugurado o edifício-garagem do aeroporto, com cinco pisos e capacidade para 2,5 mil vagas. O projeto foi desenvolvido com o objetivo de facilitar o acesso dos passageiros ao aeroporto que passará a contar com 3,4 mil vagas de estacionamento no total. A obra custou R$ 50 milhões.

Resolvida a questão do conforto, deve-se investir na melhoria das condições de segurança das pistas.