Título: Milosevic encontrado morto na cela
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Fonte: O Estado de São Paulo, 12/03/2006, Internacional, p. A18

Ex-presidente iugoslavo que orquestrou as guerras dos Bálcãs morre meses antes do fim de seu julgamento

O ex-presidente iugoslavo Slobodan Milosevic, que orquestrou as guerras dos Bálcãs na década de 90, foi encontrado morto ontem em sua cela, em Haia, poucos meses antes do fim de seu julgamento por crimes de guerra, informou o tribunal das Nações Unidas em um comunicado. Ele tinha 64 anos.

"Milosevic foi encontrado sem vida em sua cama em uma cela da unidade de detenção da ONU", informou o Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia. "O segurança alertou imediatamente o responsável pela unidade de detenção e ao médico, que confirmou que Milosevic estava morto."

O tribunal informou que serão realizados uma autópsia e um exame toxicológico. Um porta-voz disse que não era possível afirmar as causas da morte até que a autópsia seja concluída, mas não havia indícios de que tenha sido um suicídio. O chanceler holandês, Bernard Bot, disse que Milosevic morreu de causas naturais. Legistas de Sérvia e Montenegro participarão da autópsia a pedido do governo de Belgrado.

Milosevic, conhecido como o "açougueiro dos Bálcãs" sofria de problemas cardíacos, o que interrompeu repetidamente seu julgamento em Haia por genocídio, crimes contra a humanidade e de guerra durante a sangrenta desintegração da Iugoslávia nos anos 90.

Dois cardiologistas que tratavam de Milosevic em Haia tinham advertido que ele corria o risco de morrer por causa da hipertensão. Um aumento repentino da pressão arterial poderia afetar o coração, os rins e o sistema nervoso central.

Um funcionário do partido socialista de Milosevic, Zoran Andjelkovic, disse: "Esperamos que o tribunal explique por que não permitiu que ele se submetesse a um tratamento na Rússia." O irmão do ex-líder sérvio, Borislav Milosevic, acusou o tribunal de ser o responsável pela morte. Outro funcionário do partido afirmou: "Eles o mataram. Esses bastardos!"

O assessor jurídico de Milosevic, Zdenko Tomanovic, disse que o ex-líder sérvio temia que estivessem tentando envenená-lo na prisão em Haia. O tribunal da ONU rejeitou o pedido de Tomanovic para que a autópsia de Milosevic fosse realizada em Moscou.

No mês passado, o tribunal negou um pedido de Milosevic para viajar para a Rússia para um tratamento médico com um especialista, argumentando que seu julgamento, iniciado em fevereiro de 2002, já estava na fase final e ele poderia retornar para sua finalização.

Milosevic, que foi deposto em 2000 e enviado a Haia em junho de 2001, disse no mês passado que sua saúde estava piorando e escutava ruídos dentro de sua cabeça. Milosevic, que estudou Direito, fazia sua própria defesa.

Milosevic enfrentava 66 acusações em complexos processos judiciais - iniciados após os conflitos da Bósnia, Croácia e Kosovo - que se arrastavam até ontem.

A morte de Milosevic ocorreu uma semana após a testemunha-chave no processo, o ex-líder servo-croata Milan Babic, ser encontrado morto na mesma prisão. Em 2002, Babic descreveu ao tribunal a estrutura político-militar liderada por Milosevic em Belgrado. Babic, que cumpria pena de 13 anos de prisão, se suicidou.

O julgamento de Milosevic e do ex-ditador iraquiano Saddam Hussein eram considerados como os mais importantes testes legais desde que os tribunais de Nuremberg e Tóquio levaram importantes líderes à justiça após a 2ª Guerra.

Os julgamentos vinham sendo criticados por causa das freqüentes interrupções e pelo fato de dar aos acusados a oportunidade de usar a corte para lançar violentos ataques contra o Ocidente.