Título: 'Acredito que ela vá ajudar as mulheres do Chile'
Autor: Denise Chrispim Marin
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/03/2006, Internacional, p. A23

Moradora da casa 4.143 da rua Antonio Acevedo H. na favela da Victória, na periferia de Santiago, María Inez Gurritia, 24 anos, votou em Michele Bachelet nos dois turnos, em dezembro do ano passado e janeiro deste ano, e e confia que a nova presidente "vai ajudar as mulheres".

Faxineira e analfabeta, ela está desempregada desde o nascimento de Luz Estevan, de ano e três meses. Vive com os pais, um irmão, Luz e outro filho de 4 anos, Umberto Antonio, num barraco de terra batida, onde não há camas para todos. María Inez é uma mostra do desafio que o novo governo da socialista Bachelet - nascida numa família de classe média alta do Chile, filha de um brigadeiro da Força Aérea leal a Salvador Allende, que morreu nas prisões da ditadura de Augusto Pinochet - terá de enfrentar na área social.

Há quatro anos, quando Umberto era bebê, María Inez estava igualmente desempregada e sem dinheiro para as fraldas e o leite do menino.

Doente, não podia amamentar. Desde então, pelo menos o pai conseguiu emprego em uma feira de roupas, o irmão começou a trabalhar como carteiro e, nos últimos dias, a mãe voltou a trabalhar numa empresa de serviços de limpeza.

"Continuo sem dinheiro para as fraldas. Dói não ter como sustentar os meus filhos e ter de aceitar a comida que a minha família me dá", afirmou. "Queremos juntar dinheiro para comprar uma casa e não ter de ir para a rua com os meninos", completou sua mãe, Angela Uribe.

Resultado da invasão de uma área pública na periferia de Santiago, a favela da Victória deu sinais claros de melhora nas condições de vida de seus moradores nos últimos anos, apesar de casos como o de María Inez e sua família.

Casas antes de madeira foram reformadas e reconstruídas com tijolos, ruas antes de terra foram asfaltadas, e a meninada vai à escola rigorosamente uniformizada.

As grades, entretanto, dão o sinal do aumento da violência, desencadeado pelo tráfico de drogas e a elevação do número de dependentes químicos.

Esses são os principais problemas locais, segundo uma das coordenadoras do bairro, María Florencia Rebolledo, dona de casa de 49 anos, casada com três filhos, cuja casa de tijolos e piso de cerâmica foi construída graças aos subsídios governamentais.

"Tivemos até cinco famílias vivendo em um mesmo barraco aqui nos anos 80", afirmou. "Quando minha casa era um ranchinho, fazia mais frio dentro, no inverno, que fora dela. Agora, vivemos no paraíso", completa Maria Florencia.