Título: Gripe aviária já faz estrago no Brasil
Autor: Patrícia Campos Mello
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/03/2006, Economia & Negócios, p. B1

Embarques de carne de frango do País caíram 7,8% e podem cair mais

A gripe aviária já começa a fazer estragos nas exportações brasileiras de frango. Com o pânico da gripe se espalhando, em alguns países o frango simplesmente desapareceu dos pratos dos consumidores. No mês passado, as vendas externas caíram 7,8% (redução de 50 mil toneladas). Segundo analistas, as exportações brasileiras devem ficar estagnadas ou cair até 15% em 2006 - o que representa uma perda de US$ 525 milhões.

A tendência de queda das exportações deve se acelerar daqui para a frente. Em março e abril serão renovados contratos e importadores japoneses começam a tirar proveito da crise, exigindo descontos nos preços. A receita das empresas brasileiras para enfrentar a crise é a trivial: redução da produção em até 25%, demissão de funcionários e férias coletivas.

No Paraná, um dos Estados que mais exportam frango, o cenário pessimista é de um corte de 10 mil funcionários. Até agora, pelo menos 250 pessoas perderam o emprego. A Avipal, grande exportadora de frango, programou férias coletivas para abril porque, com a queda na exportação, seus estoques estão muito altos. A Frango Sertanejo, de Guapiaçu, interior de São Paulo, vai demitir 100 funcionários do seu quadro de 2,7 mil: em fevereiro, suas exportações caíram 64% por causa da gripe aviária.

Segundo cálculos da Embrapa, a cadeia produtiva do frango gera 4 milhões de empregos no País, dos quais 400 mil podem desaparecer por causa da gripe. "Será a primeira vez na História que as exportações brasileiras de frango vão cair ou ficar estagnadas", diz Ricardo Gonçalves, presidente da Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frangos (Abef).

O Brasil é o maior exportador de frango do mundo desde 2004, ano em que deixou para trás os Estados Unidos. Além da redução do consumo por causa da gripe aviária, dois outros fatores vão prejudicar as exportações de frango neste ano: o baque do dólar e os altos níveis de estoque na Europa, Rússia e no Oriente Médio.

Segundo Gonçalves, 85% das empresas filiadas à Abef estão adotando medidas de ajuste. O setor vai pedir ao governo a criação de uma linha de crédito emergencial para financiar estoques durante a crise. "A redução nas exportações vai exigir um ajuste contundente", diz o presidente da Abef. Em dezembro, havia 415 milhões de aves alojadas no Brasil. Para ele, será preciso reduzir esse número para 300 milhões.

Inicialmente, os produtores acreditavam que seriam beneficiados pela gripe do frango, já que não há registros da doença no Brasil. No ano passado, os resultados foram positivos - o País ganhou mercado da Tailândia, que foi atingida pela gripe e reduziu o fornecimento. Em 2005, o Brasil exportou 2,845 milhões de toneladas de frango, 15% mais que em 2004. A receita com exportações foi de US$ 3,508 bilhões, um crescimento de 35% na comparação com 2004. Mas, neste ano, o consumo global de frango está caindo a uma velocidade muito superior ao esperado e todos os exportadores devem ser afetados.

RECOMENDAÇÕES

No começo de fevereiro, a União Brasileira de Avicultura (UBA) e a Abef fizeram uma reunião para recomendar aos produtores que reduzissem a produção em 10% a 15%. Mas, há alguns dias, a Abef precisou radicalizar sua orientação e passou a recomendar aos sócios um corte de 25%. "Os números de fevereiro vieram bem abaixo do esperado", afirma Gonçalves.

Para Clóvis Puperi, diretor-executivo da União Brasileira de Avicultura (UBA), os próximos 90 dias serão muito difíceis. Mas, segundo Puperi, só será possível dimensionar a magnitude da crise quando a doença chegar ao Brasil - se chegar. "Se a gripe aviária não chegar ao Brasil, o produtor terá perda de renda, mas será menor", diz.

Na Alemanha, onde aves, gatos e até uma marta (mamífero parecido com o texugo) foram contaminados com a doença, a avicultura já acumula perdas de 143 milhões. A demanda por frango caiu de 15% a 20%.

A ONU afirma que o H5N1, o vírus causador da gripe aviária, pode chegar ao Brasil dentro de 6 a 12 meses. Mas Liana Brentano, virologista de aves da Embrapa Suínos e Aves, não acredita nesse tipo de previsão. "Precisamos estar preparados, mas não se pode espalhar o pânico, o vírus pode simplesmente não chegar até o Brasil."

"Estamos no olho do furacão, é difícil fazer previsões e a queda de produção pode acabar sendo menor", diz Gonçalves. "O frango brasileiro, saudável, pode até acabar se beneficiando."

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a gripe aviária já causou perdas de US$ 10 bilhões nos países afetados. O medo da gripe vai levar a uma queda mundial no consumo de aves que pode chegar a 3 milhões de toneladas. Na Europa, a redução do consumo oscila de 70% (na Itália) a 20% (na França). Na Índia, a queda é de 25%.