Título: 'Bolívia quer sócios, não patrões'
Autor: Eduardo Kattah e Raquel Massote
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/04/2006, Economia & Negócios, p. B1

Os governos brasileiro e boliviano iniciaram ontem um esforço conjunto para arrefecer os ânimos em torno da decisão da Bolívia de nacionalizar suas reservas de gás e petróleo. O presidente da Bolívia, Evo Morales, no entanto, reiterou, de maneira enfática, que um dos principais objetivos de seu governo é o melhor aproveitamento econômico dos recursos naturais para combater as desigualdades sociais do povo boliviano.

Ao discursar no encerramento da solenidade de abertura oficial da Reunião Anual das Assembléias de Governadores do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), em Belo Horizonte, ele observou que seu país tem de aproveitar ao máximo os recursos naturais - citando a exploração do gás natural -, "que não podem ser negócios privados, têm que ser serviços públicos".

Evo disse também que o governo boliviano necessita de "sócios e não de patrões". Segundo o presidente da Bolívia, é "uma vergonha" um país com tantas riquezas e com um povo "mendigo". "Isso tem que terminar."

Na entrevista após o evento, Evo assegurou que a nova regulamentação para a exploração das reservas de gás não implicará a expropriação de bens das empresas petroleiras que atuam no país. "Uma coisa é o recurso natural, outra coisa são os bens das empresas. Não vamos expropriar os ativos das empresas, nem sua tecnologia ou suas indústrias. Mas, sim, vamos exercer o direito de propriedade sobre os recursos naturais que pertencem por lei e pela constituição aos bolivianos".

REUNIÃO

Antes do evento, o presidente da Bolívia se reuniu com uma missão brasileira composta pelo assessor especial da Presidência para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, o presidente da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli, e o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães. A discussão teve um caráter mais "político", como disse Garcia, e "protocolar", como considerou Evo.

O presidente da Petrobrás enfatizou que a estatal é produtora de energia. "Esse critério é o critério que vai fazer parte das negociações", disse Garcia, que classificou este como um dos temas "substantivos" da discussão. "Cabe à Petrobrás expor esse ponto de vista ao governo boliviano e aguardar as reações."

A intenção do governo boliviano é transferir para a estatal Yacimientos Petrolíferos Fiscales (YPFB) o controle sobre os campos de petróleo e gás do país. Na coletiva à imprensa, Evo avisou que as empresas que respeitarem a regulamentação boliviana terão garantias dos seus investimentos. "A industrialização dos recursos naturais é importante, e aí queremos contar com sócios como a Petrobrás, portanto com o governo do Brasil."