Título: Eletrodo no cérebro reverte paralisia
Autor: Lois Rogers
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/03/2006, Vida&, p. A22

Ingleses também obtiveram sucesso em casos de mal de Parkinson e avaliam aplicação em pacientes depressivos

Uma moça confinada há sete anos a uma cadeira de rodas não só está andando de novo. Ela também canta e dança regularmente em espetáculos amadores depois de uma cura espetacular. Ela recebeu implantes elétricos no cérebro.

Amy Westall, de 20 anos, é o exemplo mais dramático do tratamento experimental desenvolvido por médicos para lidar com mal de Parkinson, depressão e até paralisia.

O "recabeamento" do cérebro consiste em guiar eletrodos a áreas conhecidas por governar funções específicas. Uma pequena corrente elétrica é fornecida por uma bateria implantada embaixo da clavícula e ligada por fios a eletrodos no próprio cérebro.

DISTONIA

Westall, moradora de Melton Mowbray, no condado inglês de Leicestershire, sofria de uma enfermidade genética chamada distonia, em que espasmos musculares violentos e incontroláveis obrigam as vítimas a contorções dolorosas, impossibilitando-as de andar.

Ela foi submetida a um demorado procedimento experimental comandado por Marwan Hariz, professor de neurocirurgia funcional do Instituto de Neurologia de Londres. Minúsculos filamentos, mais finos que um fio de cabelo humano, foram implantados em seu cérebro para transmitir a corrente elétrica que interromperia os sinais que provocavam espasmos em seus músculos. Os resultados produzidos realmente parecem milagrosos.

"É difícil encontrar palavras para o quanto isso mudou minha vida", disse Westall. "Passei sete anos de minha vida numa cadeira de rodas antes da operação. Agora não só estou andando, estou cantando e dançando em espetáculos amadores." Em vez de enfrentar uma vida de dor crescente, sofrimento e morte prematura, ela agora trabalha como ajudante voluntária de ensino e tenta encontrar maneiras de recuperar toda a formação escolar que perdeu por causa do regime de drogas pesadas necessário para controlar seu estado.

TECNOLOGIA ANTIGA

"Temos aqui uma tecnologia que é sensacional e muito importante", disse Hariz. "Ela não é nova - existe há 10 ou 15 anos para o mal de Parkinson - mas só agora está sendo mais desenvolvida." Pacientes e outros médicos têm sido cautelosos sobre a técnica por causa da associação da cirurgia cerebral com lobotomia - hoje desacreditada como violenta e perigosa.

Entretanto, os especialistas pioneiros em implantes cerebrais costumam ressaltar que o efeito é reversível. Nada impede que os dispositivos sejam simplesmente desligados.

DEPRESSÃO

O recabeamento já produziu resultados promissores em operações em todo o mundo de pacientes com enxaqueca e distúrbio obsessivo compulsivo. Hariz e seus colegas agora acreditam que a depressão provavelmente será o próximo grande distúrbio em que grandes quantidades de pacientes poderão se beneficiar da tecnologia.

Um punhado de pacientes nos Estados Unidos já registrou uma melhora substancial de ânimo depois de experimentos com implantes, e o primeiro estudo britânico está sendo finalizado.

Pacientes estão sendo identificados para um estudo da Universidade de Bristol, onde um grupo preliminar de oito indivíduos severamente deprimidos com idade superior a trinta anos serão submetidos a cirurgias este ano. Os médicos vão implantar quatro eletrodos em diferentes áreas do cérebro dos pacientes.

A partir daí, a psiquiatra clínica Andrea Malizia, que está chefiando o projeto, investigará quais dos quatro eletrodos e quais freqüências elétricas são as mais eficazes para inibir os sinais que causam a depressão.

"Até 5% da população sofre de depressão severa recorrente", contabiliza Malizia. "Os implantes podem fazer enorme diferença para muitas dessas pessoas."

MAL DE PARKINSON

Outro projeto está estudando o melhor posicionamento possível dos eletrodos para ajudar os pacientes de mal de Parkinson, que causa perda gradual de controle muscular. Mais de 100 pacientes por ano recebem agora o procedimento - que custa cerca de 30.000 libras - no sistema nacional de saúde britânico.

Um dos primeiros foi Mike Robins, da cidade de Southampton, no sul da Inglaterra, que começou a sofrer da enfermidade aos 55 anos. Por sorte, Robins teve a chance de ser submetido à cirurgia pouco depois do agravamento dos sintomas. "O tremor era tão forte que eu estava pensando em suicídio, não conseguia fazer nada", conta.

Cirurgiões do Centro Médico Radcliffe, em Oxford, deram-lhe anestesia local e usaram uma furadeira manual para penetrar seu crânio.

"Fiquei muito apavorado quando eles passaram por um ponto que fez minha fala sumir", diz Robins, que está com 62 anos agora. "Quando chegaram no ponto certo, o tremor parou completamente e sumiu para sempre. Esse procedimento é fabuloso."