Título: E como ficará São Paulo?
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Fonte: O Estado de São Paulo, 08/03/2006, Notas e Informações, p. A3

A notícia de que o nó górdio da escolha do candidato presidencial do PSDB poderia ser cortado se o prefeito José Serra concordasse em disputar o Palácio dos Bandeirantes, em vez do Planalto, a que concorreria o atual governador paulista Geraldo Alckmin, chama a atenção para um aspecto até agora negligenciado do cenário eleitoral - o que poderá acontecer com São Paulo nos próximos quatro anos. Para os 40 milhões de habitantes do Estado, essa questão talvez seja mais importante do que a da sucessão presidencial.

Em primeiro lugar, porque até onde a vista alcança a permanência de Lula em Brasília até 2010 não prenunciaria propriamente uma catástrofe. Com todas as suas limitações e os seus erros amplamente conhecidos - a que se somou o estrepitoso escândalo dos milhões escusos pagos pelo PT aos seus e a políticos de outros partidos, bem como ao marqueteiro Duda Mendonça, com dinheiro que não caiu do céu -, o presidente manteve o essencial, a política econômica, no caminho responsável aberto pelo antecessor tucano - que foi, aliás, o que lhe permitiu recuperar-se do baque inicial do escândalo do valerioduto.

Com certeza foi sua mentalidade pragmática que levou Lula a entender que, se embarcasse numa canoa populista em matéria de gestão econômica, seria ele próprio vítima fatal dessa aventura. É de esperar, portanto, que se ele continuar presidente também a economia continuará no rumo certo, apesar das renovadas pressões petistas.

Em segundo lugar, São Paulo é outra história. Caso excepcional na crônica político-administrativa da Federação brasileira, o Estado acumula 12 anos de governança austera, competente e progressista, não fosse quem o conduziu a maior parte desse período, o infatigável Mario Covas, o melhor governador de que os paulistas têm memória. Nesse sentido, o risco que eles correm nas próximas eleições é maior que o dos demais brasileiros. Dada a relação de forças no horizonte da sucessão estadual, as chances do PSDB de se manter no governo são notoriamente duvidosas.

É verdade que os índices de aprovação do governador Alckmin são os que qualquer administrador público gostaria de ostentar. Mas popularidade não se transfere - ao menos no grau necessário para a eleição do herdeiro presumível. Tendo acompanhado a amarga experiência dos paulistanos que elegeram prefeito o secretário de Finanças de Paulo Maluf, Celso Pitta, os paulistas decerto aprenderam que a emenda pode sair pior do que o soneto. Conquanto a comparação seja de todo injusta com Alckmin e os tucanos que almejam substituí-lo, ela é um componente - salvo uma reviravolta no cenário - da alta probabilidade de o PT conquistar pela primeira vez o governo estadual, o que lhe daria enorme chance de permanecer no governo federal para além de um eventual segundo mandato de Lula.

Essa reviravolta só estaria praticamente garantida numa hipótese: o lançamento da candidatura Serra. Os cálculos sobre a conveniência dessa hipótese para o partido, o prefeito e o governador levariam às seguintes conclusões: nem o PSDB nem Alckmin sofreriam um baque irrecuperável caso o governador, sendo o desafiante de Lula, fosse batido por ele. Aos 53 anos, não lhe faltarão ocasiões de tentar de novo, já então um nome nacional. Se, no entanto, a alternativa for Serra, 10 anos mais velho, uma segunda derrota para Lula quem sabe marcaria o final de sua trajetória.

Mas o prefeito não aparece nas pesquisas como o único presidenciável capaz de bater o petista? Conviria tomar os números com extrema precaução. Pelo menos parte da intenção de voto em Serra parece resultar antes do "efeito recall" de que falam os publicitários do que expressão de uma escolha fechada. Na verdade, as chances de Lula ser reeleito dependem muito mais dele próprio do que do candidato que terá de enfrentar. Por isso acreditamos que as chances de Alckmin bater Lula não são muito menores que as de Serra. E quanto à promessa de que ficaria na Prefeitura até o fim? Ao contrário do que estão afirmando alguns "blogueiros" não nos parece que descumpri-la para disputar o governo do Estado, cuja capital vem conduzindo e a cujos negócios não ficaria alheio, como governador, teria efeito pior do que se fosse para disputar a Presidência.

O destino de São Paulo, em suma, pode estar nas mãos dos presidenciáveis e dirigentes tucanos.