Título: COP8 começa em Curitiba sem Brasil ter feito a lição de casa
Autor: Eduardo Nunomura
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/03/2006, Vida&, p. A15

País não tem lei que regulamente acesso aos recursos da biodiversidade para apresentar aos participantes

A 8.ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (COP 8), o mais importante evento da Organização das Nações Unidas sobre conservação e uso da biodiversidade, que começa hoje em Curitiba coloca o Brasil numa situação delicada. Dentre os 188 países signatários, o País é o que carrega a maior responsabilidade - não apenas por ser o anfitrião, mas por deter a maior riqueza biológica do planeta.

Em contraponto às recentes vitórias sobre o desmatamento e à criação de unidades de conservação na Amazônia, o País chega à reunião ainda sem uma lei que regulamente, de maneira positiva, o acesso de seus pesquisadores à biodiversidade - a maior parte ainda desconhecida da ciência. Serão 11 dias de longos debates e negociações, com a participação esperada de cinco mil pessoas e pelo menos 100 ministros de Estado.

O tema mais importante na pauta brasileira é a negociação de um regime internacional de acesso aos recursos genéticos e repartição de benefícios por seu uso. A idéia é criar um arcabouço legal que regulamente a exploração comercial entre países e o patenteamento de produtos desenvolvidos a partir da biodiversidade, como forma de combater a biopirataria. Por exemplo, o uso de plantas e animais na confecção de medicamentos e cosméticos.

A negociação das regras opõe os países em desenvolvimento (detentores da riqueza biológica) e os países mais desenvolvidos (detentores das indústrias e da tecnologia). "É um debate com dois pontos de vista, o daqueles que têm e o daqueles que usam a biodiversidade", disse o secretário de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente, João Paulo Capobianco. "Para o Brasil, trata-se de uma questão estratégica, pois precisamos de um regime nos dois sentidos."

O Brasil quer garantir que sua biodiversidade não será explorada por outros países sem as garantias de reconhecimento e repartição de benefícios - inclusive com as comunidades detentoras do conhecimento. "Antes, a biodiversidade era considerada patrimônio comum da humanidade. A convenção estabeleceu que os recursos são de soberania dos países, e não do mundo", explica a coordenadora geral de Políticas e Programas em Biodiversidade do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), Ione Egler.

Cabe a cada país estabelecer regras internas de acesso e repartição de benefícios da biodiversidade. Nesse aspecto, o Brasil, mais uma vez, chega à reunião com a lição de casa incompleta. O projeto de lei que deveria regulamentar o tema ainda nem foi encaminhado ao Congresso, por divergências entre ministérios. A COP 8 vai até o dia 31.