Título: Palocci depõe em segredo, culpa Mattoso, mas é indiciado pela PF
Autor: Sérgio Gobetti e Vannildo Mendes
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/04/2006, Nacional, p. A4

O ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci foi indiciado ontem pela Polícia Federal (PF) por ter participado da violação do sigilo bancário do caseiro Francenildo dos Santos Costa, o Nildo. Palocci tentou transferir a responsabilidade pelo episódio ao ex-presidente da Caixa Econômica Federal Jorge Mattoso.

O indiciamento ocorreu logo após a PF ter tomado secretamente o depoimento do ex-ministro, que durou três horas, no final da tarde de ontem, na residência oficial do Ministério da Fazenda. O ex-ministro alegou estar com problemas cardíacos para ser ouvido em casa pelo delegado responsável pelo inquérito, Rodrigo Carneiro Gomes. Palocci continua usando a residência oficial do ministério uma semana depois de ter se afastado do cargo.

"O ministro nega peremptoriamente e veementemente a quebra do sigilo. Ele não divulgou o extrato, não mostrou e não quebrou o sigilo", disse o advogado de Palocci, José Roberto Batocchio, em entrevista, à noite, no Hotel Meliá Brasília.

Orientada pelos advogados, a defesa de Palocci entrou em contradição com o depoimento de Mattoso. O ex-presidente da Caixa disse que o pedido para a quebra do sigilo do caseiro teria partido do então ministro. Palocci admitiu ter recebido o extrato, mas atribuiu a Mattoso a iniciativa pela operação.

Interessava a Palocci quebrar o sigilo de Nildo para tentar desacreditá-lo, pois o caseiro desmentiu o ex-ministro, em entrevista ao Estado. Ele disse que Palocci freqüentava a mansão no Lago Sul de Brasília mantida pela chamada república de Ribeirão. Ontem, a assessoria da Caixa contestou a versão apresentada pelo ex-ministro, enfatizando que a ordem para a quebra do sigilo partiu de fora da instituição, assim como a divulgação do extrato.

"Não há nenhuma dissonância entre a versão do Palocci e a do Mattoso", tentou argumentar Batocchio.

Segundo o ex-ministro disse à PF, no dia 16 de março ele estave em reunião no Palácio do Planalto com o então presidente da Caixa. Mattoso deixou o encontro mais cedo, dizendo que precisava falar com Palocci sobre planos de expansão internacional. Os dois combinaram uma conversa mais tarde.

Na noite do mesmo dia, Mattoso foi à residência de Palocci, onde também estavam o assessor do ex-ministro, Marcelo Netto, e o secretário de Direito Econômico do Ministério da Justiça, Daniel Goldberg. De acordo com Batocchio, a conversa entre os dois ocorreu a sós e durou apenas cinco minutos, durante os quais Mattoso falou do interesse em abrir uma agência no Japão e entregou o extrato do caseiro, consultando se deveria encaminhá-lo ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).

O ex-ministro teria respondido que o presidente da Caixa deveria agir de acordo com a lei, mas ficou com a cópia do extrato para analisá-la.

"Ele recebeu o extrato, examinou no dia seguinte e, quando se preparava para devolvê-lo, recebeu a informação de que o Coaf já tinha sido comunicado", disse Batocchio.

De acordo com o advogado, o ex-ministro não mostrou o documento para mais ninguém e o teria destruído em um triturador de papel.

Ele informou ainda que Palocci estava com eletrodos no peito e na cintura durante seu depoimento e que deverá ser submetido a exames cardíacos.

Sobre a presença de Netto e Goldberg na casa de Palocci, no mesmo dia e horário, o advogado explicou que as conversas ocorreram separadamente e nada tiveram em comum. "Netto e Goldberg estavam na casa para discutir a possibilidade de os processos de Ribeirão Preto passarem ao Supremo Tribunal Federal", disse o advogado.

Confrontado com outra explicação para o encontro, apresentada à PF pelo secretário do Ministério da Justiça, de que Palocci teria lhe consultado sobre a possibilidade de a PF investigar o caseiro, o advogado admitiu que esse assunto também foi tratado. "Diante da notícia de que havia um certo senador manipulando um funcionário humilde, o pedido se justificava", disse Batocchio.

O advogado e seu sócio, José Roberto Leal, alegaram sigilo profissional para não informar se foram contratados pelo PT para defender Palocci.