Título: Iraque vive guerra civil, diz ex-líder
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Fonte: O Estado de São Paulo, 20/03/2006, Internacional, p. A12

Allawi alerta que situação está chegando ao ponto sem volta em que a violência sectária pode se espalhar pela região

BAGDÁ

Dezenas de milhares de pessoas manifestaram-se ontem em várias partes do mundo no terceiro aniversário da invasão do Iraque, enquanto o ex-primeiro-ministro iraquiano Iyad Allawi advertia que o país já está mergulhado em uma guerra civil e está chegando a um ¿ponto sem volta¿ em que a violência sectária pode se estender pelo Oriente Médio.

¿É uma desgraça que estejamos em uma guerra civil¿, afirmou Allawi em entrevista à rede de televisão britânica BBC. ¿Perdemos a cada dia uma média de 50 a 60 pessoas em todo o país. Se isto não é uma guerra civil, só Deus sabe o que é então¿, acrescentou.

Já o presidente iraquiano, Jalal Talabani, contradizendo as declarações de Allawi, afirmou que o Iraque não corre o risco de uma guerra civil e, ao contrário, foram obtidos progressos para a formação de um governo de união nacional. ¿O povo iraquiano não pode aceitar uma guerra civil. Atravessamos dificuldades, mas o apego dos iraquianos a seu país impedirá uma guerra desse tipo¿, disse.

O Iraque vive uma onda de sangrentas matanças sectárias entre a minoria sunita e a maioria xiita desde a destruição, no início do mês, de um importante templo sunita em Samara.

O vice-presidente americano, Dick Cheney, também afirmou ontem que o Iraque não está em meio a uma guerra civil e sustentou que a violência é uma tentativa desesperada dos terroristas no país de impedir o avanço para a democracia. ¿O que temos visto é um esforço sério para fomentar uma guerra civil¿, disse Cheney à TV CBS. ¿Mas creio que não tiveram êxito.¿

Em um discurso pelo terceiro aniversário da invasão do Iraque, o presidente americano, George W. Bush, disse ontem estar encorajado com o progresso obtido para a formação de um governo de união nacional iraquiano e pediu aos americanos que lembrem o sacrifício dos soldados dos EUA.

¿Eu encorajo os líderes iraquianos a prosseguirem com o duro trabalho de levar seu governo adiante¿, disse Bush na Casa Branca. Ele destacou que milhares de americanos se ofereceram para servir no Exército, especialmente após os ataques do 11 de Setembro. ¿Neste terceiro aniversário do início da libertação do Iraque, acho que os americanos deveriam agradecer aos homens e mulheres que vestem o uniforme e a suas famílias que os apóiam.¿

Manifestações pedindo o fim da ocupação do Iraque foram realizadas ontem e sábado em vários países, entre eles EUA, Grã-Bretanha, Espanha, Japão, Austrália, Coréia do Sul e Malásia. No Brasil, cerca de 2 mil pessoas marcharam pela Avenida Paulista no sábado, pedindo a retirada das forças americanas do Iraque.

A violência, entretanto, prosseguiu. Pelo menos 12 iraquianos morreram ontem em vários ataques. Soldados americanos mataram nove pessoas, entre elas vários membros de uma família, no povoado de Duluiya ¿ que fica em um reduto de resistência sunita ao norte de Bagdá, onde forças iraquianas e dos EUA iniciaram uma operação na semana passada.

Em Kerbala, três mísseis foram lançados ontem, sem causar vítimas, enquanto centenas de milhares de peregrinos chegavam a essa cidade sagrada xiita a sudoeste de Bagdá para celebrar o 40º dia da Ashura, que lembra o martírio do imã Hussein, neto do profeta Maomé.

Ainda ontem, em um artigo publicado no jornal The New York Times, o general americano da reserva Paul Eaton, encarregado de treinar o Exército iraquiano entre 2003 e 2004, qualificou o secretário americano de Defesa, Donald Rumsfeld, de ¿incompetente estratégica e operacionalmente¿ e pediu sua renúncia.