Título: Projeto utiliza água da chuva para abastecer ribeirinhos
Autor: Herton Escobar
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/03/2006, Vida&, p. A34

Calhas e caixas d'água são instaladas em região que sofreu com a seca em 2005

MANACAPURU

Pelo menos 5 mil famílias de ribeirinhos das 59 mil que sofreram com a seca nos rios do Amazonas no ano passado devem, até o fim deste ano, contar com uma tecnologia simples de aproveitamento de água de chuva - abundante durante todo o ano no Estado - para fugir da escassez durante a estiagem anual, que ocorre entre os meses de agosto e novembro.

Calhas ao longo do telhado e caixas d'água estão sendo instaladas a um custo médio de R$ 600 por casa pela Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SDS), que está em busca de financiamento para estender até 2007 o projeto batizado de ProChuva a outras 15 mil famílias, aproximadamente.

A chuva não deixou a Floresta Amazônia mesmo durante a impressionante seca dos rios em 2005. Mesmo assim, sem conhecimento para aproveitar essa água, já difundido entre os nordestinos mais íntimos das secas anuais, os ribeirinhos colocavam no filtro a água talhada (barrenta) dos rios e lagos próximos às suas casas e deixavam escorrer para a terra a chuva.

No Estado, a média é de 2,5 mil milímetros anuais de precipitação pluviométrica. No mês em que tradicionalmente menos chove, agosto, o índice chega até 150 milímetros.

"Parece paradoxal para quem não conhece a floresta, mas mesmo com os rios secos, há chuva durante todo o ano no Amazonas", explica o secretário-executivo de Recursos Hídricos da SDS, Nelinton Marques da Silva, responsável pela implantação do ProChuva.

No mês passado, depois de dez dias de obras em 64 casas, foi concluído o projeto na comunidade-piloto da Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Piranha, em Manacapuru, a 120 quilômetros de Manaus. Durante a seca, o Lago Grande, que banha a comunidade, ficou seco, deixando à míngua com a escassez de peixe e água as famílias que vivem no local.

"As meninas sofreram com febre e diarréia, porque mesmo fervendo a água talhada do rio, bebíamos uma água marrom durante a seca", conta a dona de casa Auxiliadora Santana da Silva, de 21 anos, três filhas. O ProChuva trocou o telhado de sua casa, de palha, para telhas de alumínio, a fim de facilitar a queda da água sobre as calhas, depois levada à caixa d'água.

Segundo Marques, os poços em áreas de várzea têm concentração alta de ferro na água, descartando sua potabilidade. "O Ministério da Saúde diz que o teor de ferro aceitável em água potável é de 0,3 miligramas por litro", diz. "A água nos poços das áreas de várzea do Amazonas tem concentração de ferro superior a 2,9 miligramas por litro, sem contar que muitas vezes os poços são construídos ao lado das fossas sanitárias."

De acordo com o líder da comunidade do Piranha, Sérgio Oliveira da Silva, de 300 habitantes, cerca de 80 vivem isolados no meio da floresta, sem energia elétrica do gerador. "Essas pessoas foram a que mais sofreram com a seca e agora estão com as caixas d'água também. Sofriam porque levavam do Lago Grande a água talhada para ferver em casa e ela pesa muito, porque vai com muito barro", explica.