Título: Abaixo o eucalipto
Autor: Celso Ming
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/03/2006, Economia & Negócios, p. B2

Ambientalistas e militantes do MST elegeram novo inimigo a combater: o eucalipto, orgulho do setor de papel e celulose do Brasil.

Quarta-feira da semana passada, um grupo de mulheres liderado pela ONG Via Campesina destruiu um campo experimental de eucaliptos da Aracruz, em Barra do Ribeiro, Rio Grande do Sul. Domingo, 200 integrantes do MST invadiram a Fazenda Santa Rita, em Itapetininga, do Grupo Suzano, e se puseram a derrubar eucaliptos.

Esses são dois episódios de um movimento mais amplo contra os "desertos verdes, as enormes plantações de eucalipto, acácia e pinus, que destroem a biodiversidade, deterioram os solos, secam os rios" - como está no Manifesto das Mulheres Camponesas - Via Campesina.

Há alguns anos, áreas de silvicultura das empresas de celulose vêm sendo invadidas pelo MST na Bahia, no Espírito Santo. "Florestas homogêneas de eucalipto são crime ambiental", disse o líder do MST, João Pedro Stédile, em entrevista publicada domingo pelo Estado.

Esses ataques não são prerrogativa das ONGs ambientalistas ou de movimentos sociais rurais. Há décadas está disseminada no interior brasileiro a idéia de que o eucalipto resseca e empobrece o solo e afasta a fauna: "Passarinho nenhum faz ninho em pé de eucalipto."

Nativo da Austrália, o eucalipto chegou ao Brasil em 1825. Em 1882 foi considerado agente causador da febre amarela pela população de Vassouras (RJ), que destruiu plantações. Há 100 anos, intensificou-se sua cultura no Estado de São Paulo para alimentar com lenha as locomotivas a vapor da Companhia Paulista de Estradas de Ferro.

Pelo seu rápido crescimento e por permitir cortes a cada seis anos (ou até menos), o eucalipto se tornou a melhor fonte de matéria-prima para produção de celulose de fibra curta do País, onde há cerca de 3 milhões de hectares plantados. Para comparar, em 2005 a área cultivada com arroz foi de 3,9 milhões de hectares; com feijão, de 3,8 milhões de hectares; e com café e trigo, 2,3 milhões de hectares cada um. É o que leva o MST a declarar aos ventos: "O povo está com fome, eucalipto não se come."

O eucalipto é mesmo esse agente destruidor? Se for, não estaria em xeque um dos mais importantes setores do agronegócio brasileiro, o produtor de matéria-prima para celulose?

O professor Carlos Eduardo Young, da cadeira de Economia Ambiental do Instituto de Economia da UFRJ, doutor em Economia pela University College London, estuda o assunto desde 1996. Ele não identifica na cultura do eucalipto prejuízo ambiental maior do que o provocado por qualquer outra monocultura, como pastagens, café, trigo ou soja. E vai além. Entende que o eucalipto causa menos problemas do que, por exemplo, a cana-de-açúcar, que exige revolvimentos freqüentes do solo, aplicação de produtos químicos e até queimadas. "O eucalipto é plantado uma vez e depois ninguém precisa mexer no solo."

E acrescenta: "Os prejuízos à biodiversidade se corrigem com manejo florestal. Basta intercalar as plantações com áreas adequadas de essências nativas, como recomendado pela silvicultura."

O agrônomo Walter de Paula Lima, professor do curso de Engenharia Florestal da Esalq-Usp e autor do livro O Impacto Ambiental do Eucalipto, vai na mesma direção: "É preciso tirar a palavra eucalipto das discussões. O problema é a monocultura; não o eucalipto."

Embora retire muita água do subsolo, diz ele, o eucalipto não esgota os recursos hídricos. "As críticas pressionam as indústrias, que gastam muito para se defenderem. Mas nenhuma delas pensa em deixar o País."

Young também não acredita que os ataques tenham fôlego para prejudicar o setor. A Klabin e a Aracruz, lembra, são pioneiras em tratamentos ambientais pertinentes porque se prepararam para enfrentar as críticas.

Ele observa que a cultura de eucalipto no Brasil está se qualificando para receber créditos de carbono, dentro das regras do Protocolo de Kyoto, na medida em que retiram gás carbônico da atmosfera e concorrem para a despoluição ambiental.