Título: 'Seria ingênuo acreditar em sinal de corte mais forte'
Autor: Gustavo Freire, Adriana Fernandes
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/03/2006, Economia & Negócios, p. B3

O tom de neutralidade da ata do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada ontem, não surpreendeu o diretor da Modal Asset Management, Alexandre Povoa. Segundo ele, seria até ingênuo acreditar que uma indicação mais forte seria estampada claramente pelo Banco Central (BC). "A ata relativizou os ânimos "de quem esperava que o documento sinalizasse que o próximo passo seria na direção de 1 ponto porcentual de corte."

"A mensagem não veio. Na hora da descrição dos votos, ficou a nítida impressão de que o texto foi escrito pelos vencedores e não pelos vencidos, sobretudo quando se fala de um suposto reconhecimento, pelo segundo grupo, de que os próximos passos estarão condicionados à evolução dos indicadores de inflação e suas projeções", pondera. Na avaliação de Povoa, para o grupo vencedor a principal justificativa é a dúvida dos efeitos em relação ao atraso da política monetária. Apesar de afirmarem ter observado uma "melhora no balanço de riscos" entre as reuniões de janeiro e março, disse, a preferência foi pela manutenção do ritmo de corte.

Ele destaca que um trecho da ata corre risco de receber menor importância do que merece. Ele se refere ao seguinte trecho do parágrafo 6 da ata, sobre produção industrial: "Para janeiro, os indicadores antecedentes e coincidentes da série sinalizam modesto crescimento na comparação mês a mês, persistindo, porém, a expansão da série de médias móveis trimestrais, em consonância com o que se espera para a atividade econômica ao longo de 2006".

A contradição, explica Povoa, é que, no dia seguinte à reunião do Copom, o IBGE divulgou a "decepcionante produção industrial de janeiro, de -1,7% ante dezembro, e com estabilidade nas médias móveis trimestrais". "É difícil crer que o Copom tenha tomado a decisão sem o conhecimento desse número. Se o BC sabia, não faz sentido escrever o que está escrito na ata. Se não sabia, foi surpreendido tanto quanto o mercado, o que é fator positivo para a aceleração da queda de juros."

A ata não mudou a opinião do diretor da Modal quanto à próxima reunião do Copom. "A situação permanece muito favorável em relação à inflação - com alguns bônus ainda não embutidos, como a potencial queda do preço dos combustíveis e valorização adicional do real. Além disso, destaque-se o comportamento no mínimo duvidoso da atividade econômica, certamente sem risco de aquecimento." Tal combinação, lastreada por um cenário externo que deve continuar favorável, colabora para melhorar ainda mais o balanço de riscos a favor da aceleração do afrouxamento da política monetária, completa Povoa.