Título: Rana fica presa até fim de processo
Autor: Marcelo Godoy
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/03/2006, Internacional, p. A14

Justiça decreta prisão preventiva e nega pedido de liberdade provisória da libanesa que é acusada de suborno

A economista Rana Abdel Rahim Koleilat, de 39 anos, sofreu ontem duas derrotas na Justiça. O Supremo Tribunal Federal (STF) decretou a sua prisão preventiva para que ela fique na cadeia enquanto julga o processo de extradição pedido pelo Líbano. A decisão foi tomada pelo ministro Eros Grau. Ao mesmo tempo, a Justiça de São Paulo negou os pedidos de relaxamento de prisão e de liberdade provisória feitos pelos defensores de Rana no caso em que ela é acusado de tentar subornar policiais paulistas.

Rana fugiu do Líbano em abril de 2005. Ela é acusado de participar do desvio de US$ 1,2 bilhão do Banco Al-Madina, o que causou a falência da instituição financeira libanesa. Parte do dinheiro teria ido parar nas mãos do serviço secreto sírio. Suspeita-se que esse dinheiro serviu para financiar o atentando a bomba que matou o ex-primeiro-ministro libanês Rafic Hariri, em fevereiro de 2005.

Com a decisão do STF, a economista permanecerá detida até a decisão final do supremo sobre a extradição, que pode levar de dois meses a um ano. No começo da tarde, o delegado Moacir Moliterno, da Interpol, foi até a sede do Grupo de Operações Especiais (GOE), onde Rana está presa desde anteontem, entregar a intimação à economista. Rana recusou-se a assinar o mandado de prisão. Disse apenas "non, non, non".

Moliterno disse que a Interpol identificou dois libaneses que faziam parte de uma rede de apoio a Rana no Brasil. Os nomes dos suspeitos estão sendo mantidos em sigilo. A polícia quer saber quais as atividades que o grupo desenvolvia no País. Ao ser presa no domingo passado, Rana disse que estava no Brasil fazendo investimentos em hotéis.

A economista foi localizada por investigadores da 7ª Delegacia Seccional num flat em Santana, na zona norte de São Paulo. Foi para não ser levada à delegacia, que Rana teria oferecido US$ 200 mil aos policiais. A economista alega que tudo não passou de um mal-entendido. É que ela quase não fala português e os policiais não falavam árabe.

Na decisão em que manteve a economista presa pela tentativa de corrupção, a juíza Luciana Leal Junqueira Freire afirmou que, "se houve um mal-entendido ou interpretação equivocada das palavras da investigada, tal aspecto é pertinente ao mérito da ação penal e deverá ser objeto de prova no decorrer da instrução processual". Isso significa que, para a juíza, essa fase do caso, a do inquérito, não é momento de se discutir a questão, o que só deve ocorrer durante o processo. Como não havia nada errado com a prisão de Rana do ponto de vista das formalidades legais da ação policial, a juíza decidiu negar o pedido de relaxamento da prisão feito pela defesa.

Já a liberdade provisória, para que ela respondesse à acusação em liberdade, não foi concedida porque, segundo a juíza, Rana "não possui residência fixa ou emprego lícito no País", além de ser "estrangeira em situação irregular".

Assim, mesmo que o STF decrete a extradição, a economista só será enviada ao Líbano depois do término do processo de tentativa de corrupção. Trata-se de situação semelhante ao do chileno Maurício Hernandez Norambuena, líder do seqüestro do publicitário Washington Olivetto. Norambuena já teve a extradição para o Chile decretada pelo STF, mas cumpre no Brasil a pena pelo seqüestro.

ASILO

Rana quer evitar a todo custo sua extradição ao Líbano. Ela vai pedir asilo ao Brasil, alegando ser vítimas de perseguições políticas em seu país. Ela afirmou ter certeza de que será morta se for extraditada. "Tudo isso será levado ao STF", disse o advogado Victor Mauad.

Mauad informou que ela está disposta a depor no Brasil sobre a morte de Hariri. O caso está sendo investigado pela Comissão Internacional Independente das Nações Unidas, que havia pedido à Interpol que localizasse Rana a fim de interrogá-la sobre o crime. Rana nega qualquer participação no caso.

A economista continua sendo vigiada 24 horas por dia em sua cela no GOE, no Campo Belo, na zona sul de São Paulo . Ela tem o direito de meia hora por dia de banho de sol. Não há nada em sua cela que ela possa usar para uma nova tentativa de suicídio. Anteontem, ela se aproveitou de um miniestilete para fazer um corte em seu pulso esquerdo. O corte superficial foi suficiente para que Rana fosse transferida da cadeia do 89ª Distrito Policial, onde estava, para a sede do GOE - um prédio com muros de quatro metros de altura e arame farpado, além de câmeras de vídeo.