Título: No Supremo, PT tenta enquadrar a CPI dos Bingos
Autor: Mariângela Gallucci
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/03/2006, Nacional, p. A5

Liminar petista propõe tirar do relatório tudo sobre caixa 2, caso Celso Daniel e denúncias de Ribeirão

A liminar pedida ontem pelo senador Tião Viana (PT-AC) acirrou os ânimos no Congresso. Não à toa. Além de solicitar a suspensão do depoimento do caseiro Francenildo Costa, o pedido feito ao Supremo Tribunal Federal (STF) pretende expurgar do relatório final da CPI dos Bingos documentos relacionados ao assassinato do prefeito Celso Daniel, à administração petista em Ribeirão Preto, aos empréstimos entre filiados do PT e ao caixa dois de campanha.

Ontem, o ministro Cezar Peluso concedeu apenas parte do que foi requerido - suspendendo o depoimento do caseiro. Mas o tribunal deverá no futuro decidir sobre as outras questões levantadas por Viana.

Na verdade, houve dois pedidos diferentes. O advogado Márcio Silva, que assina a ação movida pelo senador , explicou que primeiro fez o pedido de liminar com objetivos amplos. Como imaginava que Peluso não concederia uma liminar com essa extensão - e, de fato, o ministro rejeitou o pedido -, Silva entrou com uma nova solicitação de liminar, apenas para que o depoimento do caseiro fosse suspenso. E obteve sucesso.

Não há data prevista para o julgamento do mérito da ação pelo Supremo. Silva explicou que nesse julgamento o STF terá de se posicionar sobre os parâmetros de funcionamento das CPI.

Em seu despacho de ontem, Peluso afirmou que se a CPI se perde na investigação de fatos que não têm relação com o seu objeto pode configurar desvio e esvaziamento de finalidade, inutilizando o trabalho desenvolvido e "afrontando a destinação constitucional, que é a de servir de instrumento poderoso do Parlamento no exercício da alta função política de fiscalização".

Peluso observou que no requerimento para o caseiro depor não há menção à possibilidade de ele conhecer a origem do dinheiro que disse ter sido distribuído na mansão. "Noutras palavras, seu depoimento em nada ajudaria a esclarecer ou provar a suposição de que seria dinheiro oriundo de casas de jogo!", afirmou, em despacho.

O direito à intimidade, previsto na Constituição, também serviu de parâmetro para o julgamento. "Outros fatos, ainda que censuráveis do ponto de vista dos costumes ou da moral social, à medida que só respeitam à vida privada das pessoas, não podem, sequer em tese, ser objeto de CPI, porque a esta só é dado investigar assunto sobre o qual tenha competência legislativa do Parlamento. Vida e negócios privados, enquanto tais, sem vínculo com interesse coletivo, esses não entram na competência legislativa do Parlamento e, portanto, estão fora do alcance de CPI", concluiu o ministro.

A decisão de Peluso de suspender o depoimento do caseiro dividiu opiniões no Supremo. Alguns ministros, como o presidente do STF, Nelson Jobim, elogiaram a decisão. Mas há integrantes do tribunal que consideraram que não foi apropriada. As dúvidas somente deverão ser dirimidas durante o julgamento do mérito da ação protocolada ontem.

Nada mau para um depoimento que já começou polêmico. Ontem, antes de o caseiro começar a depor, o presidente da CPI, Efraim Morais (PFL-PB), decidiu realizar sessão aberta. Os governistas reagiram. A senadora Ideli Salvatti (PT-SC), por exemplo, disse que a CPI não deveria se portar como se fosse o programa Big Brother.