Título: Serra - é agora ou nunca mais
Autor: João Mellão Neto
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/03/2006, Espaço Aberto, p. A2

Geraldo Alckmin foi meu colega na Câmara dos Deputados em 1991, meu candidato a prefeito de São Paulo em 2000 e meu chefe em 2003, quando exerci o cargo de secretário de Estado da Comunicação. Sempre o admirei. Mas, vale dizer, ele não é uma pessoa que empolgue à primeira vista. Sua aparência não é carismática nem seu discurso é arrebatador. Alckmin se impõe por aquilo que faz, e não por aquilo que diz. Quando era vice-governador, disputou a Prefeitura e não chegou sequer ao segundo turno. Apenas dois anos depois voltou às urnas e se elegeu governador com folgada maioria. O que havia mudado? A diferença é que, em 2002, ele já tinha 18 meses de uma brilhante gestão a mostrar. Sua obra falava por si. E, aliás, continua falando. Segundo as pesquisas, seu governo conta hoje com a impressionante aprovação de dois terços dos paulistas.

Esta eleição presidencial será, sem dúvida, muito interessante. Alckmin é a mais perfeita antítese de Lula.

Enquanto Lula é extrovertido, expansivo e contagiante, Alckmin é grave, circunspecto e se esforça ao máximo para superar uma inata timidez. Lula é loquaz, falante e comunicativo. Alckmin, ao contrário, mede e reflete sobre cada palavra que diz. A oratória de Lula é vibrante, retórica, passional e efervescente. Já a de Alckmin é calma, lacônica, incisiva e convincente. Lula arrebata os corações. Alckmin prefere conquistar as mentes.

Num confronto entre os dois, em qual deles você apostaria?

Depende. Lula tem mais "arranque" e Alckmin tem mais "final". Converse cinco minutos com Lula e ele conquistará o seu voto. Dialogue meia hora com Alckmin e seu voto mudará de mãos.

Alckmin tem o que mostrar. Com exceção da Febem, todos os números de sua gestão são excelentes.

Lula, por sua vez, tem a seu favor o fato de ter mantido uma política econômica austera e conta com o Bolsa-Família, que, embora não tenha sido criado por ele, foi expandido até chegar a uma rede de 11 milhões de pessoas, que, somadas aos parentes, chega a 30 milhões de beneficiários. Esses eleitores deverão optar pelo presidente.

Os pontos fortes de Alckmin são a eficiência administrativa e a questão moral. Não ocorreu um único escândalo em todo o período que governou São Paulo. Embora, segundo a pesquisa CNI/Ibope, apenas 15% dos eleitores se recordem do escândalo do mensalão, será por aí que o governador de São Paulo deverá golpear os flancos de Lula. Tem chances de vencer?

Tudo é possível. Basta lembrar que, em março de 2002, a seis meses das eleições, como agora, as pesquisas para o governo de São Paulo indicavam que Paulo Maluf venceria seus adversários já no primeiro turno. Acabou não chegando sequer ao segundo. O eleito, com tranqüilidade, foi Geraldo Alckmin. O mesmo que, na pesquisa, não contava com mais de 17% de apoio.

Por falar do governo de São Paulo, é para ele que se voltam, agora, todas as atenções. O PSDB, que administrou o Estado por mais de 11 anos, corre seriamente o risco, agora, de perdê-lo para o PT. Os candidatos tucanos que já se apresentaram não são competitivos. As pesquisas indicam que Marta Suplicy, a nossa soberba ex-alcaideissa, não tem adversários nessa disputa. A não ser que... Serra se disponha a se candidatar a governador.

Serra, provavelmente, está abatido e relutante. Acaba de perder a indicação de seu partido para a candidatura presidencial. E ele anseia ser presidente desde a adolescência. É a sua segunda derrota. A primeira foi para Lula, quatro anos atrás. A segunda foi agora, para Geraldo Alckmin. De que lhe adianta agora arriscar-se numa candidatura ao governo de São Paulo?

Muito. E ele tem de se decidir já nos próximos dias. A alta cúpula nacional do PSDB o está pressionando de todas as formas para que dispute a eleição. A cúpula estadual está fazendo o mesmo, já que ele é a única garantia de manter o governo paulista em mãos tucanas. O PFL também pressiona Serra, já que assim resolve dois problemas: garante a Prefeitura para o vice, Gilberto Kassab, um brilhante articulador que, no poder, fará o partido crescer pela primeira vez em São Paulo; e emplaca a sua estrela maior, Guilherme Afif, atual presidente da Associação Comercial, como vice-governador.

Há até a chance de arredondar a chapa, agregando o PMDB. Isso se daria com o lançamento de Orestes Quércia para a vaga de Senador. O tempo de TV na propaganda gratuita seria um verdadeiro latifúndio. Todos sairiam satisfeitos, elegendo bancadas expressivas, quer na Assembléia Legislativa, quer no Congresso Nacional. As pesquisas disponíveis indicam que Serra venceria a eleição já no primeiro turno.

José Serra, a esta altura, já percebeu que, se ainda pretende realizar o seu sonho de vir a ser presidente, em 2010, sua chance depende de conquistar o governo do Estado, agora. Seu mandato de prefeito termina em 2008. Por mais brilhante que tenha sido a sua gestão, ele disputará a indicação do partido com Aécio Neves, que vai reeleger-se agora e chegará a 2010 na condição de governador de Minas Gerais. Serra poderá apresentar apenas o seu currículo de ex-prefeito de São Paulo, sem chances de empolgar o partido. Se, na ocasião, for ele o governador de São Paulo, obviamente o seu cacife se agiganta. Alckmin já declarou que, se vencer, não disputará a reeleição. Lula, caso se reeleja agora, não poderá disputar depois. Serra se tornaria, assim, um candidato presidencial imbatível.

Tudo depende dele. Se não ousar disputar o governo de São Paulo agora, pode dar adeus às chances de vir a ser presidente um dia.

Ele tem de se decidir, e já. Chegou, para Serra, a hora da verdade.