Título: Lula pede cabeça de quem quebrou sigilo
Autor: Vera Rosa, Leonencio Nossa, Denise Madueño
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/03/2006, Nacional, p. A6

Ordem do presidente é demitir o responsável pelo crime, seja quem for; em discurso, ele diz que denúncias contra Palocci são 'baixo nível'

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva quer "punição exemplar" para quem violou o sigilo bancário do caseiro Francenildo Santos Costa, a principal testemunha contra o ministro da Fazenda, Antonio Palocci. A ordem de Lula é demitir o responsável pela abertura dos dados, seja ele quem for. No Palácio do Planalto e no Ministério da Justiça, o gesto de quem agiu na tentativa de defender Palocci foi considerado "um tiro no pé". Agora, só resta ao governo tomar uma atitude drástica.

Em Salvador (BA), Lula disse ontem que as denúncias contra Palocci são de "baixo nível", mas admitiu que "a situação está mal". A uma platéia formada por petistas que foram ao canteiro de obras do metrô de Salvador só para vê-lo, o presidente afirmou estar disposto a entrar na briga para defender o governo.

"Um presidente da República não pode responder a todas as ofensas e ataques. Mas quem me conhece sabe que eu gosto de uma briga, adoro uma briga", insistiu Lula. "Agora, sou presidente e não posso responder a cada baixo nível que fazem contra mim." Logo depois, ele admitiu que o momento não é dos melhores. "Hoje não estou bem, a situação está mal. Mas eu acredito em Deus, sou brasileiro e lutador."

Em Brasília, a Polícia Federal reconheceu que o sigilo do caseiro foi ilegalmente quebrado pela Caixa Econômica Federal, subordinada ao Ministério da Fazenda. A Caixa é presidida por Jorge Mattoso, amigo de Palocci. A instituição também está fazendo uma auditoria interna para averiguar como a movimentação bancária de Francenildo "vazou" para a revista Época.

O ministro das Relações Institucionais, Jaques Wagner, disse que o governo vai descobrir "rapidamente" quem violou o sigilo do caseiro e punir os culpados. No Planalto, a interpretação é de que quem agiu dessa forma foi mais realista do que o rei.

Desde que Francenildo contou que Palocci freqüentava uma mansão no Lago Sul - onde, segundo ele, havia partilha de dinheiro e festas embaladas por garotas de programa -, o ministro não aparece na Fazenda. Tem despachado em seu gabinete no Planalto, para fugir do assédio de jornalistas. Palocci nega que tenha freqüentado a casa até mesmo para seus amigos mais íntimos.

Sua situação no governo, porém, continua muito delicada. Embora o discurso oficial seja de que ele fica, é possível que o ministro saia no dia 31, aproveitando a leva dos que deixarão a equipe para se candidatar às eleições. Tudo depende dos desdobramentos das denúncias.

A orientação de Lula é mesmo a de manter Palocci, o penúltimo sobrevivente do antigo núcleo duro do governo, até o limite do possível. "Eu não vou fazer o que a oposição quer", tem dito o presidente. Com a crise política, todos os antigos companheiros de Lula caíram: além de Palocci, só restou o secretário-geral da Presidência, Luiz Dulci.

Em reunião da coordenação política do governo, realizada ontem pela manhã no Planalto, os petistas decidiram partir para a ofensiva contra o PSDB e o PFL, que têm se revezado na tribuna do Congresso para pedir a demissão de Palocci.

"Há um movimento claro da oposição para gerar um clima de desestabilização no País", afirmou o líder do PT na Câmara, Henrique Fontana (RS).

O deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP) seguiu na mesma linha. Disse que o governo Lula tem agüentado calado "várias provocações", mas, a partir de agora, vai reagir.

"Não vamos mais aturar o senhor Antônio Carlos Magalhães dizer que está estarrecido. Será que ninguém se lembra quem violou o painel do Senado?", insistiu Greenhalgh, numa referência ao escândalo que provocou a renúncia do senador do PFL, em 2001. "Quem não respeita o Estado de direito é a oposição."