Título: Bastos está disposto a sair, mas governo tenta segurá-lo no posto
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Fonte: O Estado de São Paulo, 11/04/2006, Nacional, p. A4

O Palácio do Planalto está empenhado em manter a qualquer custo o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, que tem confidenciado a interlocutores seu desconforto no cargo. Ele avalia que só tem a perder permanecendo no governo. Segundo fontes ouvidas pelo Estado, Bastos teria inicialmente estabelecido um prazo de 40 dias para deixar o posto. Mas, após a revelação de que estivera na casa do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci na companhia do advogado Arnaldo Malheiros, decidiu acelerar etapas para viabilizar sua saída, reduzindo o trauma para o governo.

O ânimo de Bastos começou a arrefecer quando se divulgou que dois altos funcionários do Ministério da Justiça - o secretário de Direito Econômico, Daniel Goldberg, e o chefe de gabinete, Cláudio Alencar - estavam na residência de Palocci quando ele recebeu do então presidente da Caixa Econômica Federal, Jorge Mattoso, os extratos da conta bancária do caseiro Francenildo dos Santos Costa, o Nildo. Bastos rebateu com ênfase a interpretação de que ambos participaram do complô para vasculhar a vida do caseiro e tomou a decisão de sair do governo se tivesse de demitir seus auxiliares. A atitude do ministro foi interpretada nos meios políticos como confissão de que sabia da quebra de sigilo e, por isso, não admitia que a conseqüência recaísse sobre os dois subordinados.

Depois, foi obrigado a admitir que também estivera na residência de Palocci, em data posterior. Embora negue ter conversado na ocasião sobre a violação do sigilo bancário do caseiro, Bastos terá de convencer o Congresso e a opinião pública de que não foi cúmplice de Palocci na operação. Também precisará afirmar que não indicou Malheiros para orientar juridicamente o ex-ministro. E, ainda, que Goldberg e Alencar não o informaram da primeira reunião com Palocci. A pressa de Bastos, agora, é para apresentar sua versão, implicando gravemente Palocci - e depois sair de cena.

O ministro sabe que nos meios jurídicos seu comportamento tem sido condenado e teme pelo desgaste de sua biografia. "Ele está numa situação muito delicada", disse o jurista Miguel Reale Júnior. Bastos também já foi avisado de que a Comissão de Ética Pública da Presidência poderá ser acionada para julgar sua conduta no episódio. A comissão tem reunião marcada para o dia 24 e vem recomendando às autoridades que não deixe nenhum tipo de dúvida sobre seu comportamento.

VINGANÇA

Bastos disse ontem ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva que Palocci tenta se vingar, espalhando versões fantasiosas. "Eu não tenho nada a esconder", afirmou ele a Lula. A suspeita de Bastos tem por trás a áspera discussão com o ex-ministro, há 16 dias, pouco antes de sua queda. Na ocasião, avisou Palocci que o governo não iria protegê-lo e Mattoso revelaria à Polícia Federal sua participação na quebra de sigilo. Ouviu um furioso Palocci fazer ameaças, acusando-o de ser cúmplice por ter participado de reunião em sua casa para discutir sua defesa no episódio.

A resposta de Bastos, naquele dia, foi um palavrão. Em conversas reservadas, o ministro tem dito que foi "usado" por Palocci, porque ele teria lhe pedido apenas a recomendação de um advogado - no caso, Malheiros. Na reunião de ontem no Planalto, Bastos garantiu que quer dar todas as explicações sobre o caso rapidamente. Queria antecipar sua ida ao Congresso, mas não teve sucesso.