Título: Mal na fotografia
Autor: Dora Kramer
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/04/2006, Nacional, p. A6

Se a matemática do PSDB já tinha sido difícil de entender no ato da escolha de seu candidato à Presidência da República, com a pesquisa do Datafolha divulgada domingo a equação ficou ainda mais incompreensível.

O partido tinha um candidato em situação de empate com Luiz Inácio da Silva, com amplo conhecimento nacional e índices de rejeição baixos. Optou pelo que estava em posição desfavorável e argumentou que a aposta seria de risco mais reduzido.

É um raciocínio. Esquisito, mas em matéria de pensamento cada um faz o que quer com seus argumentos. Mas há os fatos, esses carrascos.

E, nesta seara, a pesquisa produziu um fato bastante negativo para os tucanos: na penúltima pesquisa do mesmo instituto o PSDB aparecia no patamar dos 40% das preferências, ombro a ombro com Lula; na última apareceu 20 pontos porcentuais atrás do oponente.

Se pesquisa é a fotografia do momento, o tucanato apareceu mal no presente instantâneo. Pode melhorar nos flagrantes futuros, até mesmo no de amanhã, na pesquisa CNT/Sensus, e fornecer ao PSDB um alento, reavivar no partido a esperança de se manter durante a campanha, da largada à chegada, em condição de polarização com o presidente candidato.

Mas a primeira impressão logo após a escolha e depois de 15 dias de exposição diária (nem sempre positiva, diga-se) foi ruim. Era de se esperar que só o impacto da candidatura mexesse com os índices de Geraldo Alckmin, para cima.

O movimento, no entanto, foi no sentido contrário e houve um recuo de três pontos porcentuais. Dentro da margem de erro? Certo, mas um recuo capaz, senão de abater completamente os tucanos, pelo menos de impedi-los de posar ao público como fiéis depositários dos prejuízos da crise e já uma alternativa mais consistente aos que não pretendem votar em Lula. Nesse sentido, o PSDB desceu - e muito - de patamar. Basta ver que a discussão provocada pela pesquisa foi em torno do segundo lugar. Antes, os tucanos eram assunto de, digamos assim, primeira. Saía uma pesquisa e o debate corria sobre a possibilidade de José Serra ganhar ou perder de Lula.

Domingo o tema era a hipótese de Anthony Garotinho, do PMDB, disputar a segunda posição com Alckmin. Dê no que der, evoluam os acontecimentos como evoluírem, a realidade é que o PSDB caminhou passos atrás e viu-se na iminência de constatar que a aposta na construção de um candidato-novidade pode ser um projeto mais complicado do que faz crer o óbvio descontentamento do público "com tudo isso que está aí".

O apoio ao anti-Lula não parece ocorrer por gravidade, nem há sinais de reedição do cenário de 1989, quando Fernando Collor cresceu no vácuo do desastre econômico do governo José Sarney e na identificação dos outros candidatos com os partidos atuantes na Constituinte, só por representar o "novo" no imaginário popular.

Não há, é evidente, termos de comparação entre os candidatos Alckmin e Collor. Este vinha de um governo desastroso em Alagoas, cujas malfeitorias foram ignoradas pela imprensa porque havia o afã de se promover alguém que pudesse afastar Lula e Leonel Brizola da cadeira presidencial. Alckmin tem aprovação inequívoca da população de seu Estado, carreira política consolidada e nem de longe pode ser qualificado como um arrivista, um desclassificado.

Mas é uma incógnita na cabeça do eleitorado, que, escaldado, talvez ainda esteja em busca de portos mais seguros onde desembarcar de mala, cuia e esperança à deriva.

Projeto Itamar

O ex-governador Orestes Quércia repudia versão amplamente disseminada em seu partido, o PMDB, segundo a qual o lançamento da candidatura de Itamar Franco à Presidência da República é um mero estratagema para forçar o PSDB a incluí-lo na roda de negociações em torno de uma candidatura dele ao Senado na hipótese de uma aliança entre pemedebistas, tucanos e o PFL.

Quércia vai por partes: "Primeiro, não preciso inventar candidatura alguma para conversar com o PSDB", diz ele, informando que os tucanos já o procuraram - "não por causa de Itamar, mas pela força política que tenho em São Paulo" - e a candidatura ao Senado é assunto em pauta.

"Em segundo lugar, a idéia de lançar Itamar não é só minha." De acordo com ele, o nome do ex-presidente foi lembrado pelo senador Pedro Simon. "Achei interessante porque Itamar tem muito mais condições de unir o PMDB do que Garotinho", diz Quércia, patrocinador da pré-candidatura de Germano Rigotto e ainda um forte oponente do ex-governador do Rio de Janeiro.

Para concluir, Orestes Quércia assegura a continuidade do projeto Itamar e diz contar com o apoio interno de Jarbas Vasconcelos, Rigotto, Roberto Requião e do senador José Sarney - "ele, aliás, gostou muito da idéia".

Ou morte

A proclamada independência em relação à opinião pública que os acusados de quebra de decoro têm pregado - com sucesso - a seus colegas na Câmara acaba no dia em que o voto para cassação deixar de ser secreto.