Título: Bolívia descarta desapropriação ou confisco de empresas de gás
Autor: Lu Aiko Otta
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/03/2006, Economia & Negócios, p. B7

Mas governo vai 'castigar todas as empresas que se comportaram mal'

Jornais bolivianos destacaram ontem em suas edições eletrônicas, que a nacionalização do gás terá sete medidas básicas, segundo relacionou o vice-presidente da Bolívia, Álvaro García Linera. Nenhuma delas prevê desapropriação ou confisco de bens das empresas estrangeiras em operação no país.

As mais drásticas são "castigar todas as empresas que tenham se comportado mal e que não tenham cumprido com seus deveres com o Estado" e controlar uma maior porcentagem das ações das empresas privatizadas a partir de 1996, como disse Garcia, que chegou a citar, neste caso, as companhias Andina, Chaco e Transredes, de acordo com informações veiculadas pelos jornais La Razón e Jornada.

Na segunda-feira, o presidente Evo Morales anunciara que a nacionalização seria concretizada até 12 de julho. A declaração foi feita durante evento de apresentação do plano nacional de alfabetização, no município de Camiri, considerado "a capital petrolífera da Bolívia", cujo aniversário de fundação é justamente 12 de julho. Mas as bases do projeto de nacionalização ainda estão sendo discutidas por uma comissão de técnicos do Ministério de Energia.

O banco de investimentos Merril Lynch divulgou ontem um relatório dizendo que ainda é difícil avaliar os impactos econômicos da nacionalização do gás na Bolívia sem conhecer detalhes do projeto. Felipe Leal, analista do banco, considera, porém, que mesmo no pior cenário - com o governo retomando tudo e desapropriando as empresas estrangeiras em operação no país -, o prejuízo para a Petrobrás não seria avassalador, já que sua produção na Bolívia corresponde a apenas 2,4% do total. Já o peso da estatal brasileira para a economia boliviana é inversamente proporcional: a Petrobrás é hoje a maior empresa da Bolívia, onde já investiu mais de US$ 1,5 bilhão nos últimos 12 anos.

"Não acredito numa medida extrema. Até porque a Bolívia não tem condições de, sozinha, explorar, produzir e transportar o gás de suas reservas. Acho que o que o governo vai tentar fazer é conseguir preços melhores pelo produto", disse o analista, destacando também o incidente diplomático que uma medida como essa causaria, o que não interessa ao governo boliviano, alinhado politicamente ao governo brasileiro.

Segundo informações divulgadas ontem pela Agencia Boliviana de Información (ABI), as medidas relacionadas por García Linera são: recuperar o controle dos hidrocarbonetos na boca do poço; assumir o controle dos processos de distribuição e comercialização; controlar o maior porcentual das ações das "petroleiras capitalizadas" (Andina, Chaco e Transredes); iniciar o processo de industrialização de gás natural em conjunto com as prefeituras; desenvolver uma campanha de distribuição maciça de gás natural à população; castigar as empresas que não tenham cumprido com seus deveres com o governo, e desenvolver projetos de industrialização, em parceria com as prefeituras.

Segundo a imprensa boliviana, o vice-presidente se compremeteu a dar "garantias absolutas a todos os investimentos estrangeiros que ingressarem no país, que têm o direito de investir, mas têm de se submeter às novas regras do Estado".