Título: Kirchner abre todos os arquivos da ditadura
Autor: Ariel Palacios
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/03/2006, Internacional, p. A15

Com a medida, processos contra militares poderão ser agilizados

Na antevéspera do 30º aniversário do golpe que deu início à última ditadura argentina, o governo do presidente Néstor Kirchner ordenou ontem a abertura total dos arquivos das Forças Armadas dos tempos do regime militar. O anúncio foi feito pela ministra da Defesa, Nilda Garré, que indicou que a resolução engloba o Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas, os Estados-Maiores Gerais do Exército, Marinha e Aeronáutica e o Conselho Supremo das Forças Armadas. O "acesso pleno" também será aplicado a todas as repartições do Ministério da Defesa. Os documentos ficarão à disposição do Arquivo Nacional da Memória.

A ordem, inédita na história do país, foi recebida com silêncio pelos oficiais argentinos, que atualmente passam por seu ponto mais baixo de influência política em 196 anos de existência das Forças Armadas.

Segundo Garré - ela própria uma exilada na época da ditadura, que cassou seu mandato como deputada federal -, o objetivo da ordem é o de que os organismos de defesa dos direitos humanos tenham acesso irrestrito aos "fatos gravíssimos ocorridos em nosso país" durante a ditadura. Assim, poderão ser agilizados os processos contra os militares que cometeram crimes contra a humanidade.

O regime instalado com a derrubada da presidente civil María Estela Isabelita Martínez de Perón, em 24 de março de 1976, foi responsável pela morte de 30 mil civis. Os corpos da maioria das pessoas assassinadas nunca foram localizados. Os militares também seqüestraram 500 bebês, filhos de prisioneiras políticas. O paradeiro de quase todos eles, hoje adultos, é desconhecido. Só 82 recuperaram sua identidade original.

Desde a volta da democracia, em 1983, os militares afirmam que não têm documentos sobre os desaparecidos e os bebês, já que os dados teriam sido queimados nas últimas semanas da ditadura. Mas as ONGs acreditam que as informações estejam escondidas nos arquivos militares.

Ontem à tarde, Kirchner definiu a última ditadura como "a mais sanguinária" da história argentina. "Mas os militares não puderam vencer-nos."