Título: Mantega: Levy não tem sintonia com a política social de Lula
Autor: Ribamar Oliveira
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/03/2006, Economia & Negócios, p. B4

Presidente do BNDES contesta secretário do Tesouro e diz que sua visão é 'conservadora'

Guido Mantega Presidente do BNDES

"Este governo tem por objetivo elevar o valor do salário mínimo e executar os programas sociais. Isso é o que diferencia este

governo. Nenhum burocrata

pode impedir que o presidente o faça. Quem for contra, está em outro governo."

"Havia um esqueleto na época de Fernando Henrique Cardoso que este governo foi obrigado a pagar. Foram milhares de ações

movidas por aposentados nos tribunais de pequenas causas, que queriam receber a correção dos benefícios...Se o

custo disso for descontado das despesas da Previdência Social em 2005, verifica-se que a

elevação dos gastos provocada

unicamente pelo aumento

do mínimo foi bem menor."

"Os aumentos para o salário

mínimo foram concedidos sem prejudicar o superávit primário"

"A estratégia definida pelo

presidente Lula foi a de promover o crescimento econômico com maior criação de emprego

e melhor distribuição de renda."

O presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Guido Mantega, acusou o secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy, de ter "uma visão conservadora, não sintonizada com a política social do governo Lula". Mantega contestou o estudo feito por Levy, divulgado recentemente no site do Ministério da Fazenda na internet, que aponta o aumento do salário mínimo como o responsável por parte substancial do crescimento do gasto público em 2005.

"Contesto os dados do estudo, estão equivocados", afirmou. "Este governo tem por objetivo elevar o valor do salário mínimo e executar os programas sociais. Isso é o que diferencia este governo. Nenhum burocrata pode impedir que o presidente o faça. Quem for contra, está em outro governo", disse. "Ele (Levy) apresentou uma visão conservadora, em desacordo com a filosofia do governo."

Mantega disse que Levy, na análise do resultado da Previdência em 2005, não levou em conta as despesas decorrentes do pagamento de decisões judiciais relacionadas à conversão inadequada dos benefícios para a nova moeda na implantação do Plano Real. "Havia um esqueleto da época do governo Fernando Henrique Cardoso que este governo foi obrigado a pagar. Foram milhares de ações movidas por aposentados nos tribunais de pequenas causas, que queriam receber a correção dos benefícios."

Em 2005, segundo Mantega, esse "esqueleto" custou entre R$ 5,5 bilhões e R$ 6 bilhões. O total foi estimado pelo governo em R$ 11 bilhões. Por isso, o presidente do BNDES considera "um grande equívoco" Levy dizer que os gastos com benefícios previdenciários em 2005 subiram 16% por causa do salário mínimo. "Se o custo do esqueleto for descontado do total das despesas da Previdência Social em 2005, verifica-se que a elevação dos gastos provocada unicamente pelo aumento do salário mínimo foi bem menor."

As despesas com benefícios previdenciários em 2004 foram de R$ 125,7 bilhões, segundo o Ministério da Previdência Social. Elas passaram para R$ 146 bilhões em 2005. Mantega argumenta que, deste total, deve-se excluir R$ 6 bilhões que decorrem do pagamento de parte do "esqueleto".

Com isso, as despesas cairiam para R$ 140 bilhões e representariam um crescimento nominal de 11,3% em comparação com 2004. O aumento nominal do Produto Interno Bruto (PIB) do ano passado é estimado pelo governo em 9,4%. Ou seja, o crescimento das despesas com benefícios previdenciários teria ficado pouco acima do crescimento do PIB.

O presidente do BNDES contestou também a análise de Levy sobre os gastos com seguro desemprego e com os benefícios assistenciais. O "equívoco", segundo Mantega, foi considerar o aumento do salário mínimo como o único responsável pela expansão dessas despesas. "No caso do seguro desemprego, houve elevação expressiva do número de trabalhadores que recorreram ao benefício", disse. "A elevação dos gastos assistenciais decorreu também da ampliação dos direitos a esses benefícios prevista em lei aprovada pelo Congresso."

Para demonstrar o compromisso do presidente Lula com a responsabilidade fiscal, Mantega lembrou que o superávit primário da União foi elevado. O superávit passou de 2% do Produto Interno Bruto (PIB), na média do segundo mandato do governo Fernando Henrique, para 2,6% na média dos últimos três anos. "Os aumentos para o salário mínimo foram concedidos sem prejudicar o superávit primário", argumentou. "O governo conteve alguns gastos, como os de custeio, para elevar as despesas sociais, como os gastos com o Bolsa Família."

Para Mantega, o presidente tinha de cumprir as promessas de campanha de elevar o salário mínimo e ampliar os programas sociais. "A estratégia definida pelo presidente Lula foi a de promover o crescimento econômico com maior criação de emprego e melhor distribuição de renda. Este é o novo modelo de crescimento."

Mantega também criticou Levy por este ter dito que o Banco Central pode não ter reduzido a taxa de juros em ritmo mais rápido por causa do impacto que o aumento do piso salarial, a partir de abril, terá sobre a demanda agregada. "A taxa de juro não tem nada a ver com salário mínimo e fazer essa relação é sofisma, é forçação de barra. O Banco Central tem espaço para reduzir ainda mais as taxas de juros, mesmo com os aumentos dados ao mínimo."