Título: Chávez sonha com Conselho da ONU e complica Lula
Autor: Denise Chrispim Marin
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/03/2006, Nacional, p. A17

Washington vê ameaça e faz campanha para escolha da Guatemala

A Venezuela de Hugo Chávez promete criar uma situação embaraçosa entre os países da América do Sul e os Estados Unidos e colocar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em uma sinuca diplomática. Ainda nos bastidores, Chávez relançou a candidatura de seu país a uma vaga no Conselho de Segurança das Nações Unidas, como um dos dois representantes latino-americanos para o biênio 2007-2008. Indicou ainda que vai explorar sua prerrogativa de chefe de Estado e defender pessoalmente as posições de seu país nas sessões mais delicadas que chegarem ao conselho.

Washington não assiste passivamente a essa "ameaça" e iniciou discretas gestões para convencer os países da região a votarem no outro país candidato, a Guatemala. Para os EUA, não poderia haver pior cenário no Conselho de Segurança que a presença da Venezuela - país que, além de atacar sistematicamente a política externa americana, apóia o regime de Cuba e declarou-se aliado do Irã na área nuclear. A decisão deverá ser tomada no início de outubro pela Assembléia-Geral da ONU.

No governo Lula, que se tornou uma espécie de aliado de toda hora da Venezuela, a questão promete converter-se em polêmica interna. No Palácio do Planalto, a posição é claramente favorável ao voto à Venezuela.

Nesse ponto de vista, seria incoerente deixar de apoiar o único país sul-americano a candidatar-se à vaga não-permanente, o aliado estratégico na integração regional e na área de infra-estrutura e o vizinho cujo governo é aplaudido pelo seu "excesso de democracia". Trocar a Venezuela pelo voto à Guatemala, portanto, seria impensável.

ITAMARATY

O assessor especial da Presidência para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, mostra-se cauteloso ao tratar do caso. "Minha opinião sobre o tema já está muito formada. Mas vou discuti-la dentro do governo", afirmou ao Estado. "Essa é uma questão que caberá ao Itamaraty conduzir. O presidente será informado da decisão."

No Itamaraty, a cautela segue outra lógica - a do puro pragmatismo diplomático. A Venezuela seria um candidato natural, mas, se a Guatemala vier a apoiar o Brasil para outro posto desejado pelo governo em organismos internacionais, certamente terá o voto de Brasília. A diplomacia brasileira ainda trabalha com a hipótese da composição entre países do Grupo da América Latina e do Caribe (Grulac) para apresentar uma candidatura de consenso. Tradicionalmente, a fórmula do consenso tem sido empregada, o que se reflete em maior respaldo ao país escolhido.