Título: Ala do PMDB quer ignorar Justiça
Autor: Denise Madueño, Isabel Sobral
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/03/2006, Nacional, p. A12

Vidigal mantém liminar que impede prévias; oposicionistas estavam dispostos a realizá-las mesmo com proibição

O ministro Edson Vidigal, presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), decidiu ontem à noite manter a liminar dada sexta-feira que impede a realização das prévias, hoje, para escolha do candidato do PMDB à Presidência. Foi mais uma lance da guerra jurídica em que se transformou a questão.

Antes da decisão de Vidigal, o PMDB pretendia converter as prévias em consulta, se fosse restabelecida a proibição das eleições internas como desejam os governistas do partido. Vidigal voltou ontem a Brasília do Maranhão para analisar a decisão do ministro Amilton Carvalhido que acolheu recurso da ala oposicionista pela manutenção das prévias.

O presidente do partido, Michel Temer (SP), anunciou que recorrerá de qualquer decisão contra o processo de escolha do candidato. "Mesmo que haja uma 'Vidigada' de última hora, a decisão não vai mudar. Amanhã (hoje) haverá prévia, mesmo que seja uma consulta", afirmou o pré-candidato Anthony Garotinho (PMDB-RJ), que disputa com o governador do Rio Grande do Sul, Germano Rigotto, o direito de enfrentar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na disputa presidencial. Ele comemorou o despacho de Carvalhido de derrubar a liminar concedida por Vidigal na sexta-feira. "A decisão restabeleceu a autonomia do partido. Foi uma decisão jurídica", afirmou.

Os dois pré-candidatos trataram Vidigal como inimigo nº 1. Eles acusaram o presidente do STJ de ter agido em interesse próprio. Vidigal é amigo do governista senador José Sarney (PMDB-AP) e quer ser candidato a governador do Maranhão com um petista como vice.

"Faço um apelo a Vidigal. Quero que ele faça o exame com o foco exclusivamente jurídico para que não haja tensão entre o PMDB e o Judiciário", afirmou Temer, lembrando que muitos peemedebistas se deslocaram de seus locais para participar das prévias. Ele também sugeriu que o ministro continuasse fazendo suas visitas no Maranhão no fim de semana.

"Todo mundo sabe das ligações políticas de Vidigal. Infelizmente ele mistura sua posição política, suas amizades com o que não poderia misturar e faz uma interferência indevida", afirmou Rigotto.

Vidigal rebateu as críticas de Garotinho, Rigotto e Temer. "Não posso ser candidato se eu não sou filiado a nenhum partido. Já requeri o meu pedido de aposentadoria, mas enquanto eu não for aposentado, eu sou juiz", disse o ministro.

O presidente do PMDB afirmou à tarde estar seguro a respeito da decisão de Carvalhido, que derrubou a liminar de Vidigal contra as prévias. "É tão consistente que não será possível derrubá-la pela forma jurídica", disse Temer, para quem a suspensão das prévias feita por Vidigal anteriormente fere a autonomia dos partidos.

SEM RECUO

A estratégia dos que defendem a candidatura própria é fazer a eleição interna de qualquer jeito: "A gente faz as prévias e depois vê o que acontece", resumiu o presidente do PMDB para os dois pré-candidatos. Eles decidiram repetir a estratégia de 2004, quando mantiveram a convenção nacional suspensa por uma liminar. O recurso foi derrubado antes do encerramento da reunião.

A diferença, agora, é que além do boicote dos governistas, terão de enfrentar a resistência de diretórios regionais preocupados com a regra da verticalização das coligações. No cenário da proibição de alianças estaduais entre partidos adversários na disputa presidencial, boa parte dos diretórios se recusa a aceitar os limites impostos por uma candidatura própria.

É esse grupo que promete desmontar as prévias em 12 Estados (AM, AP, AL, BA, CE, MA, PA, PB, PI, RO, RR e SE). Não por coincidência, o boicote deve partir dos 12 diretórios que assinaram o pedido de nova convenção nacional em 8 de abril, convocada justamente para derrubar o candidato do PMDB ao Planalto, no caso de a consulta ser realizada e validada pela Justiça.

O que dá segurança a Temer e aos pré-candidatos na ofensiva para manter as prévias são as regras que eles próprios aprovaram. O critério adotado dá a cada Estado um peso que não corresponde ao número de eleitores das prévias. O Rio Grande do Sul de Rigotto, por exemplo, tem 3.303 eleitores. Mas, com o critério do peso, vai somar 4,27% do total geral de votos das prévias. Já o Rio de Janeiro de Garotinho, com apenas 1.237 eleitores, tem peso maior: 14,11% da soma nacional.

Temer e os pré-candidatos concluíram que, a despeito do boicote, poderão garantir 76% dos votos. Pelo critério de pesos, os 12 Estados que ameaçavam não participar das prévias somam 24% de todo o Brasil.