Título: Tribos não querem lei para mineração
Autor: Mariana Caetano
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/04/2006, Nacional, p. A11

A Conferência Nacional Indígena, que se encerra amanhã em Brasília, deverá rejeitar o projeto de lei elaborado pelo governo Lula para regulamentar a mineração em terra indígena, hoje ilegal. O Ministério da Justiça esperava obter o apoio dos caciques e dos representantes dos índios para encaminhar o projeto ainda neste ano ao Congresso Nacional.

A proposta nasceu do trabalho de um grupo interministerial criado há dois anos, após o massacre de 29 garimpeiros na Reserva Roosevelt (RO), dos cintas-largas. Há 15 dias, outros dois garimpeiros foram mortos na reserva, e um terceiro foi baleado, após uma briga por partilha de diamantes.

A conferência criou uma comissão para estudar a proposta e decidir sobre ela em até dois anos, mas o assunto ainda é tema de disputa. "A princípio, jogamos essa discussão para a próxima conferência, mas não podemos mais adiar esse debate. A tendência é tomar uma posição contrária ao projeto agora", afirmou Azelene Kaingáng, presidente do Conclave dos Povos Indígenas da América do Sul e presidente do Warã Instituto Indígena. "Vamos construir um projeto desde o início com o governo e não aceitar nada pronto."

Na prática, a conferência quer ir mais longe. O documento final a ser apresentado amanhã - Dia do Índio - deve incluir como reivindicação dos 240 povos do País a propriedade coletiva das terras indígenas. A Constituição garante a eles o usufruto permanente das reservas, mas a propriedade é da União. No modelo defendido na conferência, os índios ganham autonomia sobre seus 12,5% do território nacional, inclusive sobre o subsolo. "O usufruto não é suficiente", resumiu Azelene.

A Carta atribui à União a propriedade do subsolo, em área indígena ou não. Polêmica, a proposta depende de emenda constitucional de difícil aprovação. Até porque não existe na Lei a figura da propriedade coletiva.

Presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Mércio Pereira Gomes ainda acredita na possibilidade de enviar a regulamentação ao Congresso neste ano. "É razoável que uma comissão estude o projeto", afirmou. Na Reserva Roosevelt, onde a tensão é permanente, os cintas-largas concordaram em interromper o garimpo de diamantes na expectativa de que a regulamentação fosse acelerada.

Com a participação de 800 delegados, reunidos desde o dia 12, a conferência rejeitou a criação de um Ministério Indígena e decidiu lutar pelo fortalecimento da Funai. Também aprovou moção para que a fundação tenha um presidente indígena no futuro. "Acho uma grande idéia", afirmou Gomes. A conferência resolveu ainda criar, no médio prazo, um Parlamento Indígena. A idéia é ter um fórum permanente de deliberação, com um representante de cada etnia, que interaja com o Congresso.