Título: 'Combate à inflação não pode ser amarra'
Autor: Denise Chrispim Marin
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/03/2006, Economia & Negócios, p. B4

Indústria quer evitar dilema entre crescimento e índices inflacionários

A indústria quer que o próximo governo, qualquer que seja o presidente eleito, defina uma agenda de crescimento em que a preocupação com os índices inflacionários deixe de ser uma amarra imposta ao desenvolvimento do País. O tema foi debatido ontem por representantes do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) e da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).

O centro da discussão é o chamado produto potencial, um indicador da tendência de demanda usado pelo Banco Central (BC) para definir a política de juros que faça com que a inflação venha a convergir para a meta fixada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Para o setor industrial, a estimativa de quanto seria possível crescer sem provocar inflação é uma profecia auto-realizável.

"Toda vez que o crescimento se aproxima de 3% ou 3,5%, a economia é abatida a tiros pelo BC", afirmou o presidente do Iedi, Josué Gomes da Silva.

Para o empresário Eugênio Staub, da Gradiente, a argumentação de que o País não pode crescer mais acaba contaminando os próprios empresários. "Se a regra do governo é que o crescimento não pode passar de 3,5%, o empresário não vai investir apostando numa taxa maior. Isso é uma burrice do governo." Staub citou o setor de eletroeletrônicos para afirmar que é possível crescer a taxas elevadas sem causar inflação. "Desde 2003, a taxa de crescimento do setor em que atuo tem sido muitas vezes superior à da expansão da economia. "Não só houve capacidade para fazer a produção e atender a demanda como os preços caíram."

Pedro Passos, presidente do Conselho de Administração da Natura, disse que o setor de produtos de higiene pessoal e cosméticos cresce de 5% a 6% ao ano, em termos reais (descontado a inflação) nos últimos 10 anos. "Apesar disso, não reajustamos os preços acima do IPCA." Já Paulo Francini, diretor da Fiesp, criticou a equipe do BC por desconhecer o lado real da economia. "Se me perguntarem quantas vezes o BC falou com a Fiesp sobre as condições da atividade industrial, a resposta é nenhuma."

O Iedi defende um horizonte maior que o ano-calendário para o sistema de metas de inflação. "Em vez de um ano, poderiam ser dois, o que não constrangeria o crescimento nem afrouxaria o combate à inflação", observa Júlio Sérgio Gomes de Almeida, diretor-executivo do Iedi.