Título: Saída de Portman é mau sinal para Doha
Autor: Paulo Sotero
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/04/2006, Economia & Negócios, p. B7

A decisão do representante comercial dos Estados Unidos (USTR), Robert Portman, de trocar a condução da política de comércio exterior pela Diretoria da Administração e Orçamento da Casa Branca (OMB) foi recebida como um sinal negativo para o rumo das negociações da Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC), que estão para entrar na fase decisiva.

A exemplo do USTR, o OMB é um posto ministerial, com funções semelhantes às do Ministério do Planejamento no Brasil. Portman, um ex-deputado de Ohio próximo do presidente George W. Bush, disse que a conclusão da Rodada continuará a ser "alta prioridade" de Washington, depois de ser oficialmente nomeado para o cargo. Susan Schwab, uma das três vices do USTR na gestão de Portman, vai sucedê-lo e reiterou o empenho da administração Bush nas negociações na OMC.

Da perspectiva da administração, a transferência de Portman para o OMB é parte de uma estratégia iniciada pelo novo chefe de gabinete de Bush, Joshua Bolten, que assumiu o cargo na segunda-feira, para reanimar um governo politicamente paralisado pela impopularidade da guerra do Iraque. Trata-se, também, de trazer para um ministério-chave um político experimentado para negociar as diferenças de política fiscal que dividem os republicanos na montagem da proposta orçamentária de 2007.

Do ponto de vista da política comercial, o fato de Portman deixar o USTR apenas 11 meses depois de ter sucedido Robert Zoellick foi interpretado em Washington como uma confirmação da reorientação das prioridades políticas da administração. Isso porque ocorre num momento em que o aumento dos sentimentos protecionistas no Congresso e a falta de apoio dos americanos a Bush tornam a agenda de comércio politicamente radiativa para parlamentares republicanos que disputarão as eleições em novembro.

"Portman é acima de tudo um político", observou um diplomata. "O fato de ele deixar o USTR neste momento traz a óbvia mensagem de que o comércio deixou de ser um tema de sucesso em Washington." Segundo essa fonte, Susan Schwab é uma burocrata respeitada, mas não tem nem a capacidade de articulação política de Portman nem o lastro intelectual e a estatura de Zoellick.

"A forma mais simpática de apresentar a decisão é que ela representa, por parte da administração, um reconhecimento de que Doha está devagar e o talento de Portman pode ser mais bem aproveitado em outra área", disse Gary Hufbauer, do Instituto de Economia Internacional. "A forma menos simpática é que ela significa um rebaixamento da política de comércio exterior como prioridade, e acho que é assim que ela será vista pelos ministros de outros países."