Título: Morales, outra vez, ataca a EBX
Autor: Agnaldo Brito
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/04/2006, Economia & Negócios, p. B9

Nas vésperas do início das negociações com os líderes do Departamento de Santa Cruz, o governo da Bolívia volta a atacar a siderúrgica brasileira EBX. Em uma reportagem publicada ontem pelo jornal El Deber, o governo reiterou sua decisão de expulsar a empresa do país. Segundo o texto, o governo ¿ratificou uma vez mais que está trabalhando nas medidas que adotará para expulsar da Bolívia a EBX, medidas que serão executadas nos próximos dias¿.

O ministro da Previdência, Juan Ramón Quitana, disse ao jornal que o governo ¿não negociará sobre nenhuma circunstância a permanência da empresa no país, o governo não negocia com empresas ilegais que transgridem a Constituição¿.

Já na sexta-feira, em um anúncio intitulado ¿EBX, uma estrangeira que procura dividir os bolivianos¿, o presidente Evo Morales, tinha afirmado que a empresa será expulsa.

Segundo o jornal, a EBX começa a ficar isolada na batalha com o governo. Ele informou que os líderes da Província de Germán Busch adotaram a atitude de não defender a empresa, mas o empreendimento.

O complexo siderúrgico instalado na Zona Franca, próximo à fronteira com o Brasil, já recebeu US$ 50 milhões em investimento. Dos quatro fornos para produção de ferro gusa só um está montado. Um segundo teve a montagem iniciada e outros dois estavam nas fundações. A meta era iniciar a produção no segundo semestre.

A decisão do governo de negar a licença ambiental à empresa revoltou a população de Germán Busch. Consideram inaceitável a intervenção do governo e a proibição de um projeto siderúrgico.

Segundo Edil Gericke, presidente do comitê de Puerto Suarez, a expulsão da empresa provocará uma rebelião na região. ¿Pode ter certeza, a região defende a permanência da EBX. Ao contrário do que o governo diz, não houve qualquer descumprimento das leis locais, tampouco o empreendimento é nocivo ao meio ambiente.¿

A crise na região oriental da Bolívia deve ter esta semana um desfecho. Hoje haverá uma reunião entre o governo e representantes das 15 províncias que formam o Departamento de Santa Cruz. O encontro acertado na sexta-feira garantiu a suspensão do ¿paro cívico¿ (greve) iniciado dia 19 em Germán Busch.

O ato fechou a fronteira com o Brasil, interrompeu o tráfego na estrada de ferro e na rodovia que liga a região com Santa Cruz de la Sierra, além de ter suspendido o funcionamento do comércio, bancos e repartições públicas.

Informações que circularam na região davam conta de que o governo se preparava para uma ação militar na província na sexta-feira. A idéia era deslocar tropas para abrir as estradas e a fronteira com o Brasil.Com o acordo que resultou na suspensão do paro cívico, os soldados foram liberados.

Baseando-se nas últimas declarações de Morales, a perspectiva é a de que a região terá uma resposta negativa para as reivindicações centrais. Se isso ocorrer é certo que Morales terá de enfrentar com pouco mais de 100 dias de governo uma greve geral de um dos principais departamentos do país, responsável por 30% do PIB nacional. O ¿paro cívico¿ na região equivaleria a uma greve geral do Estado de São Paulo.

Segundo Herman Antelo, presidente do Comitê Pró-Santa Cruz ¿ organização que reúne os comitês cívicos de todo o Departamento ¿ , a negociação com o governo não suspendeu qualquer item da resolução que a assembléia-geral dos comitês tirou na semana passada.

O principal é o de organizar uma greve de 24 horas se Morales não aceitar as reivindicações. Além da exigência de que o governo seja mais generoso no repasse de recursos para saúde e educação, a região exige medidas para a geração de empregos.

Para tanto, consideram fundamental um pronunciamento do governo que assegure a validade e garanta a conclusão da licitação para a exploração da Jazida de Mutún, onde há 40 bilhões de toneladas de minério de ferro. Há três empresas que concorrem neste momento. A japonesa Nippon Steel, o grupo argentino Techint, e a MMX - Mineração e Metálicos S.A., controlada pela EBX, de Eike Batista.

'A Bolívia já não é terra de ninguém'

O presidente da Bolívia, Evo Morales, reafirmou seu propósito de "mudar a Bolívia para sempre" através do plano do governo de orientação socialista. Sua intenção está expressa em mensagem publicada ontem na imprensa do país por ocasião do primeiro trimestre de sua gestão.

Morales, à frente do Movimento ao Socialismo (MAS), ganhou as eleições presidenciais de dezembro com 54% dos votos e assumiu a Presidência em janeiro para um período constitucional de cinco anos. "Passaram apenas 90 dias, restam pela frente quase cinco anos nos quais o governo do povo mostrará sua firmeza e eficiência para mudar a Bolívia para sempre", afirmou no documento.

Morales diz que recebeu "um país destruído, desunido e desmoralizado por duas décadas de políticas neoliberais". O presidente acrescenta que, agora, "80% dos bolivianos acompanham o processo de mudança iniciado em 22 de janeiro e somente pequenos grupos oligárquicos ou funcionais continuam colocando seus interesses acima dos interesses da Bolívia".

A mensagem sustenta que o país "está recuperando a dignidade e a confiança", e que "já não se submete aos interesses estrangeiros"como ocorreu em toda a história nacional. "Tanto os países como as empresas estrangeiras devem saber que a Bolívia já não é terra de ninguém. A Bolívia se respeita", enfatiza, com a mesma frase usada para informar sobre a decisão de expulsar a companhia brasileira EBX por uma suposta violação das leis locais.