Título: Amorim se diz surdo ao lobby dos europeus
Autor: Renato Cruz
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/04/2006, Economia & Negócios, p. B13

O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, devolveu com inusitada indiferença as recentes pressões da União Européia para que o Brasil adote o seu padrão de TV Digital. Logo depois de um almoço "cordial" com o comissário europeu para o Comércio, Peter Mandelson, o chanceler jurou "por Deus" que não ouviu o lobby feito por seu convidado.

Na semana passada, Mandelson apertou o torniquete contra o Brasil ao declarar publicamente que o País acabaria internacionalmente isolado caso optasse por um dos padrões concorrentes, o americano ou o japonês.

Na quinta-feira, o grupo interministerial que discute o tema não chegou a uma conclusão sobre o padrão a ser adotado. Nos dias 9 e 10 de abril, os ministros das Telecomunicações, Hélio Costa, e da Casa Civil, Dilma Rousseff, deverão desembarcar no Japão e na Coréia do Sul para verificar as vantagens do sistema nipônico e negociar contrapartidas com o governo e empresas locais.

"Ele falou, mas eu não ouvi. Esse é um assunto que o governo negocia e só conversa de maneira coletiva, no grupo coordenado pela ministra Dilma Rousseff", disse Amorim. "Ele falou e eu não ouvi. Juro por Deus que não me lembro porque eu não tinha interesse."

Segundo o embaixador da União Européia no Brasil, o português João Pacheco, Mandelson estava ciente de que a discussão vem sendo conduzida pelo grupo interministerial e, portanto, não caberia uma negociação com Amorim naquele momento. Entretanto, o comissário reafirmou a posição européia e aproveitou o almoço para entregar um memorando ao chanceler.

A rigor, o encontro entre Amorim e Mandelson teve caráter bilateral, como parte da visita oficial do comissário ao Brasil, cujo principal objetivo seria reforçar o lobby de Bruxelas sobre o padrão de TV Digital. O governo brasileiro, entretanto, mostrou-se indisposto a ouvir as demandas européias.

Mandelson não teve a chance de tratar do tema com nenhuma outra autoridade, depois do o silêncio do Palácio do Planalto ao seu pedido de audiência com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Sua vinda ao Brasil, acabou restrita a uma passagem por São Paulo e pelo Rio de Janeiro, onde hoje mergulhará nas negociações da Rodada Doha.