Título: Com só 0,55% da meta cumprida, Primeiro Emprego é abandonado
Autor: Lisandra Paraguassú
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/04/2006, Nacional, p. A4

O governo federal desistiu do programa Primeiro Emprego.

Lançado com toda pompa há quase três anos, o programa naufragou. Desde julho de 2003, conseguiu empregar 3.936 jovens, quando o plano inicial era 260 mil vagas por ano - o que daria 715 mil jovens empregados nesses 33 meses.

O rendimento pífio, de apenas 0,55% do pretendido, levou o governo a deixar de lado a idéia - inicialmente considerada brilhante - de pagar a empresas R$ 1,5 mil por ano para contratarem jovens de 16 a 24 anos. O que era uma das maiores promessas do governo Luiz Inácio Lula da Silva terminou como um programa "marginal", esquecido e criando poeira no Ministério do Trabalho.

Pior do que isso, o programa hoje repassa dinheiro para empresas que tradicionalmente já contratam jovens e continuariam a fazê-lo mesmo que o Primeiro Emprego não existisse. Os maiores contratadores são empresas de telemarketing, redes de supermercados e lanchonetes. O maior contratador individual, a rede de supermercados Zaffari, do Rio Grande do Sul, é responsável por 1.104 vagas - mas a empresa sempre contratou jovens, assim como a rede de lanchonetes McDonald's, em São Paulo, que empregou 532 jovens, dos 763 que o programa atendeu no Estado.

A razão do fracasso não é difícil de encontrar: a idéia do Primeiro Emprego estava errada de início. Partia do pressuposto de que jovens não conseguem emprego porque não têm experiência e, como as contratações são caras, as empresas preferiam investir dinheiro em alguém experiente. As duas idéias estão erradas, como já mostravam análises feitas na época e concluiu uma análise feita pelo próprio governo quase dois anos depois do lançamento da idéia.

DEMITIDOS

Um estudo feito pela economista Priscila Flori, da Confederação Nacional da Indústria, antes do lançamento do programa, mostra que jovens conseguem emprego sim, apesar da inexperiência. Só que não ficam empregados. Priscila decompôs a taxa de desemprego dos jovens e descobriu que 80% dos desempregados nessa faixa etária não procuram o primeiro emprego. Já trabalharam antes, mas foram demitidos.

"Há uma alta rotatividade e isso pode ocorrer por várias razões: desistência, falta de qualificação, volta aos estudos. Mas não necessariamente por falta de experiência, porque o primeiro emprego aparentemente eles conseguem", explica Priscila. "O programa partiu de uma premissa errada. Logicamente não poderia funcionar."

O Ministério do Trabalho teve acesso ao estudo de Priscila - sua tese de mestrado - antes de o programa ser lançado. Mas ele foi ignorado. "Fizeram algumas modificações, mas não mudaram a idéia central do programa. Acho que preferiram apostar na idéia, que já estava para ser lançada", conta ela.

O economista Marcio Pochmann levanta outra questão que parece não ter interessado ao governo: a de que é preciso que existam essas novas vagas. "As contratações dependem do nível de atividade econômica do País, do crescimento, não de subvenções", diz ele. "Projetos assim não deram certo na Europa, em lugar nenhum. Por que dariam no Brasil?"

A conseqüência mais imediata do desastre do programa é uma lista de mais de 200 mil jovens decepcionados. São aqueles que acreditaram na idéia e estão até hoje esperando. Apenas 2% de felizardos conseguiram lugares. As irmãs Bruna e Beatriz Baccilieri Rauter - a primeira tem 20 anos e a segunda, 17 - estão entre as que desistiram de esperar. Moradoras da Vila Aricanduva, em São Paulo, as duas se inscreveram no ano passado. Beatriz está terminando o ensino médio e quer fazer faculdade. Bruna já cursa farmácia em uma faculdade particular. Os salários da mãe, funcionária pública, e do pai, bancário, não bastam para pagar duas faculdades. "Queria trabalhar para poder pagar o cursinho e depois, a faculdade", diz Beatriz. "Foi meio decepcionante. Até agora não consegui nada". Bruna diz que está difícil para a família arcar com a mensalidade de R$ 550 da sua faculdade. Ela já trabalhou em uma empresa de telemarketing mas foi demitida e hoje está procurando emprego de novo.