Título: 'Senti orgulho de meu filho'
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/04/2006, Internacional, p. A28

Pais de Chris Hanley relutavam em ouvir sua ligação para o 911, mas acabaram confortados

NOVA YORK

Joe e Marie Hanley decidiram inicialmente que não, não iriam escutar a gravação de seu filho, Christopher, no dia 11 de setembro de 2001 pedindo ajuda no restaurante Windows on the World, no topo de uma das torres do World Trade Center. Eles haviam recebido um telefonema da prefeitura dizendo que Christopher tinha ligado para o 911 na trágica manhã dos atentados terroristas.

A família Hanley está entre as 27 que souberam nos últimos dias que as autoridades nova-iorquinas tinham gravações dos telefonemas feitos para o 911 por seus parentes nas Torres Gêmeas. Por ordem judicial, essas gravações foram entregues, esta semana, a parentes das vítimas.

Embora perturbadoras, as fitas têm uma força única, são uma espécie de portal para um momento perdido. Por isso, os Hanleys acabaram decidindo recebê-las. Na segunda-feira, eles foram à Secretaria de Justiça, assinaram alguns papéis e levaram a gravação para sua casa, no East Side de Manhattan. Eles retiraram do aparelho de som um disco de Beethoven e puseram um CD branco com o nome impresso de seu único filho, Christopher James Hanley.

"Hora da ligação: oito horas, ciqüenta minutos e trinta segundos", dizia uma voz estranha - apenas quatro minutos após o impacto do primeiro avião. Então surgiu uma voz familiar dos alto-falantes. "É, oi, estou no 106º andar do World Trade Center, houve uma explosão", disse o filho dos Hanleys. "No 106º andar?", perguntou a operadora. "Tivemos uma conferência aqui", disse Chris Hanley. "Há umas cem pessoas aqui."

O avião tinha se chocado contra o edifício entre o 94.º e o 99.º andar, 24 metros abaixo do restaurante, mas a fumaça tinha subido até o topo do prédio. Por isso, apesar da distância da área do impacto, as condições no restaurante rapidamente se tornaram difíceis.

As gravações disponíveis indicam que Hanley estava entre as primeiras pessoas dentro do WTC a contatar o 911. Sua voz é clara.

"Qual é seu sobrenome?', indagou a funcionária do 911.

"Hanley", respondeu.

"H-A-N", afirmou a funcionária.

"Temos fumaça e está muito ruim", disse Hanley.

Um momento depois, a operadora respondeu. "Ok. Temos o serviço. Deixe-me conectar você com o serviço de bombeiros, ok?"

"Sim", respondeu Hanley. "Há fogo, fumaça. Temos cerca de cem pessoas aqui. Não conseguimos descer as escadas."

Os pais de Hanley disseram que reconheciam a voz do filho, não apenas no tom, mas na maneira de falar.

"Ele era forte e estava pensando tão claramente, de um modo tão bonito", comentou a mãe, Marie Hanley. "Paciente com o Departamento de Bombeiros e o 911. Isso trouxe tudo de volta", completa a mãe.

O pai, Joseph Hanley, também decidiu falar sobre as emoções e lembranças que a gravação provocou nele: "Isso me fez sentir orgulhoso dele, ele foi capaz de manter sua frieza."

"Dignidade sob pressão", disse a mãe.

A bravura dos funcionários do serviços de emergência rapidamente se tornou uma parte familiar das crônicas do 11 de Setembro. Os atos dos civis presos nos andares superiores tinham ficado amplamente invisíveis. Com as gravações, parentes têm a oportunidade de ouvir a voz daqueles que morreram, mas reabrem uma ferida.