Título: Brasileira morre em atentado na Cisjordânia
Autor: Daniela Kresch
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/04/2006, Internacional, p. A24

A carioca Helena Halevy, há 41 anos em Israel, foi uma das quatro vítimas do ataque de quinta-feira perto do acampamento de Kedumim

A brasileira Helena Halevy morou só 18 de seus 59 anos no Rio. Mas tinha orgulho de ter nascido no Brasil, para onde voltava pelo menos uma vez por ano para visitar a família e rever Copacabana, bairro onde passou a juventude. Aos parentes, sempre dizia que morar no Oriente Médio não era tão perigoso assim. Na quinta-feira à noite, Helena e seu marido, o jardineiro Rafi Halevy, de 63 anos, entraram para a lista de vítimas do conflito entre israelenses e palestinos.

Helena, mãe de quatro filhos, era religiosa e morava no assentamento judeu de Kedumim, no coração da Cisjordânia, ao lado da cidade palestina de Nablus. Na quinta-feira, ela e o marido voltavam de uma cerimônia de circuncisão para casa quando decidiram dar carona a três jovens que viram na estrada. Os passageiros eram duas moças - Shaked Lasker, de 16 anos, e Reut Feldman, de 20 - e um rapaz, que parecia ser judeu ortodoxo. Foi ele que acionou uma bomba e matou todos os passageiros.

As duas jovens mortas foram enterradas ontem. Já os funerais de Helena e de Rafi foram adiados para domingo, a pedido da família. Parentes brasileiros foram convidados pelo governo de Israel a viajarem até o local do enterro - na própria colônia de Kedumim - e só devem chegar à região horas antes da cerimônia. O suicida foi identificado horas depois como o palestino Mahmud Masharka, de 24 anos, morador de Hebron, no sul da Cisjordânia. Ele agiu de acordo com uma nova estratégia das Brigadas dos Mártires de Al-Aksa. Disfarçou-se de judeu religioso e se aproximou de caroneiros israelenses. De acordo com o vídeo que foi divulgado pelo grupo extremista horas depois do atentado, seu objetivo era pegar carona com colonos, entrar num dos 120 assentamentos israelenses espalhados pelo território e cometer um atentado no local. Mas ao que parece, decidiu acionar os explosivos dentro do carro de Rafi e Helena Halevy ao ser interrogado pelo casal.

A morte de Helena, que trabalhava na creche da colônia de Kedumim, fez com que a Embaixada do Brasil em Tel Aviv enviasse uma carta oficial para a chancelaria israelense pedindo esclarecimentos sobre o incidente. "Não é a primeira vez que um brasileiro é vítima desse conflito, nos dois lados", disse o embaixador Sérgio Moreira Lima.

Helena Halevy é a segunda brasileira a morrer em menos de um ano vítima do conflito entre israelense e palestinos. A brasileira Dana Galkovitch, de 22 anos, foi morta por um míssil Qassam em julho do ano passado. O míssil, lançado por militantes do grupo radical Jihad Islâmica, atingiu Dana na varanda de sua casa, no vilarejo de Nativ Haassará, na Fronteira com a Faixa de Gaza.

Do lado palestino, o brasileiro Ghassan Othman Mussa, de 22 anos, que foi morto por soldados israelenses em Ramallah, na Cisjordânia, em novembro de 2004. Segundo Israel, o rapaz era procurado por sua participação em ações armadas.

O ministro da Defesa israelense, Shaul Mofaz, culpou o grupo fundamentalista Hamas pelo atentado que matou a brasileira. Para ele, o Hamas, que agora lidera a Autoridade Palestina, é responsável por tudo o que acontece na Cisjordânia e na Faixa de Gaza. Em reação, o porta-voz do recém-nomeado deputado do Hamas Mushir Al-Masri disse que o ataque é uma reação natural à ocupação de terras palestinas.

Já o presidente palestino Mahmud Abbas, em visita à África do Sul, condenou o atentado. Ele fez um apelo à comunidade internacional para que não suspenda a ajuda financeira à Autoridade Palestina por causa desse incidente. Horas depois do atentado, o exército israelense cercou a casa da família do suicida, em Hebron, e prendeu um de seus irmãos. Soldados também improvisaram postos de controle perto de Nablus, impedindo palestinos de 19 a 35 de se movimentarem entre as grandes cidades da Cisjordânia.

Aviões israelenses também foram vistos sobrevoando a Faixa de Gaza. Palestinos culparam Israel pela explosão de um carro na região, matando Abu Yousef Abu Quka, um dos principais líderes dos Comitês de Resistência Popular. O exército negou envolvimento na explosão, mas isso não acalmou os ânimos de milhares de palestinos, que culparam Israel pelo incidente. A morte de Abu Quka instigou embates entre várias facções palestinas.

A carioca Helena Halevy deixou o Rio de Janeiro ainda jovem para morar num kibutz, uma espécie de fazenda cooperativa israelense. No começo dos anos 80, após conhecer Rafi, decidiu morar numa das centenas de colônias judaicas em territórios palestinos. O casal foi um dos fundadores do assentamento de Kedumim, que, na época, recebia muito incentivo do governo israelense para se desenvolver.

Kedumim, hoje com 3 mil habitantes, acabou se tornando uma das colônias mais radicais na luta contra a devoluções da Cisjordânia aos palestinos. A prefeita local, Daniela Weiss, chegou a ser detida de maneira preventiva antes da retirada israelense da Faixa de Gaza por ser considerada um perigo à segurança pública.