Título: Dez anos de arbitragem
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/04/2006, Espaço Aberto, p. A3

A arbitragem, uma forma de resolução de litígios sem intervenção de um juiz de direito, está completando dez anos de regulamentação no País. Adotada em larga escala nos Estados Unidos e na Europa e constituindo-se numa alternativa à morosa e congestionada Justiça comum, ela deu tão certo entre nós que hoje está presente até no testamento de muitos empresários. Com receio de que disputas entre os herdeiros ponham em risco a sobrevivência de seu negócio, esses empresários determinam, por meio de cláusula testamentária, que as eventuais pendências entre filhos e demais parentes, em vez de serem levadas aos tribunais, sejam submetidas a árbitros.

Uma das vantagens da arbitragem é sua rapidez. Ela permite que casos complexos e que envolvem milhões de reais sejam decididos em 180 dias, no máximo, enquanto nos tribunais os processos demoram anos, subindo de instância em instância até chegar a uma sentença definitiva. Outra vantagem é o sigilo, pois a arbitragem permite que o caso seja de conhecimento apenas das partes envolvidas e do perito. Isso é decisivo para preservar a imagem das empresas e dos próprios controladores, o que nem sempre acontece quando conflitos sucessórios, pendências entre acionistas e conflitos empresariais são decididos pelas diferentes instâncias do Judiciário.

Os árbitros, que são escolhidos de comum acordo pelas partes litigantes, costumam ser advogados, engenheiros, médicos, economistas, administradores e tecnológos experientes e conceituados. Por conhecerem profundamente as implicações técnicas do objeto do litígio, eles podem usar uma linguagem simples e acessível às partes, o que não acontece no âmbito da Justiça. As decisões dos árbitros também tendem a ser muito mais eficientes do que as sentenças expedidas pelos juízes, cuja grande maioria pouco conhece em matéria de administração de empresas. E, como a arbitragem é terminativa, não podendo a parte derrotada impetrar recursos, ela é mais adequada às necessidades da iniciativa privada.

O grande impulso para a adoção da arbitragem, que também permite às partes determinar o procedimento a ser adotado e estabelecer o prazo para a apresentação do laudo conclusivo, pelos árbitros, foi a Lei 9.307, de 1996. Antes dela, a legislação previa que o laudo arbitral deveria obrigatoriamente ser homologado pela Justiça, o que demorava muito tempo e ainda abria caminho para a parte vencida impetrar recursos com objetivos protelatórios. Com a Lei 9.307, a cláusula de arbitragem inserida nos contratos passou a ter força obrigatória entre as partes e o laudo arbitral passou a ter a mesma eficácia de uma sentença judicial.

Entre 1997 e 2003, segundo levantamento da OAB e do Conselho Nacional de Mediação e Arbitragem (Conima), o número de câmaras arbitrais, muitas constituídas por associações comerciais, federações de indústria e outras entidades de classe, pulou de 17 para 77. Atualmente, já há mais de 100 câmaras em todo o País. Das 15 câmaras mais procuradas pela iniciativa privada, 4 estão sediadas em São Paulo e 2 no Rio de Janeiro.

Nos últimos seis anos, a demanda por essa forma extrajurisdicional de resolução de litígios, em disputas civis e comerciais, aumentou quase 60%. Ao todo, entre 1999 e 2005 foram resolvidos por esse método 13.652 casos, a maioria nos setores de petróleo e gás, energia elétrica, farmacêutico, automobilístico e de seguros. Recentemente, as áreas de construção civil, locação de imóveis e empresas de distribuição passaram a recorrer à arbitragem. Para efeitos comparativos, a American Arbitration Association, uma entidade criada há mais de 50 anos e que atua em 41 países, só em 2002 administrou mais de 200 mil casos, dos quais 3 mil envolviam disputas comerciais com valor superior a US$ 250 mil.

Além de oferecer alternativas extrajurisdicionais para a resolução de conflitos, a arbitragem ajuda a descongestionar os tribunais, tornando-se um atalho cada vez mais procurado para livrar os cidadãos do excesso de formalismo dos meios forenses.