Título: Continuidade: o mantra de Kassab
Autor: Iuri Pitta
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/04/2006, Metrópole, p. C3,4

Prefeito é desses políticos que saem de casa com o discurso na cabeça e se esforçam para não improvisar

Bruno Paes Manso

Não dá para negar que o novo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (PFL), seja um homem organizado. Para encaixar a conversa com o Estado, ontem, em sua agenda cheia de segundo dia de mandato, marcou a entrevista em um restaurante que ficava no meio do caminho de dois eventos dos quais participaria. Mandou um assessor para inspecionar a viabilidade do encontro, chegou exatamente na hora marcada - 11 horas - e ainda tinha preparado um plano B para o caso de as armações falharem (Leia a entrevista completa na página C3).

Em companhia do secretário de Coordenação das Subprefeituras, Andrea Matarazzo, não se recusou a abordar nenhum assunto. Falou da cidade, do Brasil, de aborto, de homossexualidade e, como bom sãopaulino, arriscou um palpite para o clássico de hoje entre Santos e São Paulo.

Difícil mesmo foi fazê-lo desviar-se do mantra que, pelo jeito, será o norte de seu mandato. Sempre que podia, encaixava as palavras "continuidade" e "José Serra" em suas falas.

Seguindo à risca a nova moda entre parte da classe política nacional, aquela que não se incomoda em ser identificada com o sabor "chuchu", Kassab busca sempre ser cauteloso ao dar suas respostas. É desses políticos que saem de casa com o discurso na cabeça e se esforçam para não improvisar. Fala baixo, adora os termos abstratos - como sinergia, diretrizes e integração -, buscando seguir a máxima de um de seus modelos na política, o senador Marco Maciel (PFL), que ensina que "os políticos devem sempre que podem aparecer no jornal, mas nunca nas manchetes".

Católico, de origem árabe, mas que não se incomoda em ter um amuleto judaico enfeitando a mesa em que trabalha, Kassab se define politicamente como um conciliador. Solteiro aos 45 anos, com o novo prefeito a cidade não terá uma primeira-dama. Mas Kassab é um sujeito família. Tem seis irmãos homens - todos formados em Economia e Engenharia pela USP, assim como ele, e uma irmã, formada em pedagogia pela PUC - e, na primeira noite como prefeito, em vez de comemorar com os aliados, contentou-se em jantar com os pais.

Apesar das juras de amor ao antecessor José Serra, Kassab diz ter como ídolo na política três grandes lideranças de seu partido, o PFL: Jorge Bornhausen, o já citado Marco Maciel e Claudio Lembo. "Eu me inspiro na história construída pelos três na política brasileira."

O 60º prefeito de São Paulo lembra a primeira eleição para vereador, em 1992, então filiado ao PL, como o momento mais feliz de sua carreira. As piores lembranças foram as acusações sofridas na campanha de 2004, quando era candidato a vice de Serra. "Recebi acusações injustas e infundadas."

Como um aluno bem aplicado, ele é capaz de recitar de cor algumas cifras da administração - "a Prefeitura pagou no ano passado R$ 948 milhões em dívidas" - e tem respostas para imbróglios administrativos de diferentes setores: lixo, finanças, greve da educação e transportes. Kassab também revelou que o que mais pesou na decisão do ex-prefeito José Serra em deixar a Prefeitura foram os milhões de reais vinculados às parcerias entre o Estado e a Prefeitura. Caso os tucanos deixassem o comando do governo, eles acreditam que projetos importantes para a capital sofreriam os riscos de não seguirem adiante por falta de repasses.