Título: Exército previa ação armada do PT
Autor: Marcelo de Moraes, Vannildo Mendes
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/04/2006, Nacional, p. A14

Documentos mostram que mesmo no governo Sarney clima da inteligência militar era de combate à 'subversão'

Relatório confidencial feito pelo Centro de Informações do Exército (CIE) em julho de 1987 mostra que os militares acreditavam que o Partido dos Trabalhadores defendia a luta armada e poderia caminhar para esse tipo de ação. Mesmo já sob o governo civil do então presidente José Sarney e com o Congresso discutindo a elaboração da futura Constituição, o clima entre setores de inteligência dos militares ainda era o de combate às chamadas "organizações subversivas".

Esse material faz parte dos arquivos secretos do governo militar que estavam sob a guarda da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e foram transferidos para o Arquivo Nacional, em Brasília. O Estado teve acesso a esses documentos, que ainda enfrentam muitas restrições da lei para poderem ser divulgados.

O Relatório Periódico Mensal do CIE gasta três páginas detalhando as atividades do PT, àquela altura já com sete anos de vida e sem registro de qualquer ação armada contra o governo. No capítulo "psicossocial", os militares avaliam: "A Comissão Executiva Nacional do PT, em seu boletim nacional número 25, declara ser o PT um partido de esquerda que tem por objetivo a derrubada da 'ordem estabelecida' através da 'ruptura popular'. Por esse boletim verifica-se que não apenas as organizações subversivas, que, acobertadas pelo PT, pregam a luta armada, mas também o próprio órgão oficial de divulgação do partido preconiza a radicalização."

Acrescenta: "Por outro lado, as organizações subversivas acobertadas pelo PT pregam atualmente, sob o olhar benevolente da direção nacional, a radicalização do partido contra o regime, afirmando que só através da luta armada o trabalhador derrubará a burguesia, conquistará o poder e terá condições de estabelecer o socialismo."

O assessor especial da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, Augustinho Veit, condenou o relatório: "Isso mostra o ideário paranóico desses militares, que ainda acreditavam realmente nessas possibilidades de luta armada."

O deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP), presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, ironizou o documento: "Os agentes do serviço de informações eram bons para ouvir, ver e anotar as coisas. Mas, em muitos casos, não sabiam contextualizar as informações. Esse relatório parece ser exatamente esse caso. Pelo jeito, nesse documento, não entenderam nada do que observaram e fizeram uma avaliação errada do que o partido pretendia."

No relatório, os militares avaliam até que o partido, por esses atos, estaria atuando em situação inconstitucional. "As atividades desenvolvidas por essas organizações subversivas são as do próprio PT, o que contraria, radicalmente, o previsto em lei para o funcionamento dos partidos políticos."

O relatório mostra que os militares também investigavam indícios de infiltração nas Forças Armadas. Diz o documento: "A existência de possíveis militantes de organizações subversivas, servindo em nossas unidades, representa uma vulnerabilidade e uma preocupação que poderiam ser evitadas durante a fase de seleção de nossos conscritos", propõe o documento.

"Tão inquietante quanto a infiltração, a tentativa de obtenção de informações sobre organizações militares, particularmente no que tange ao armamento e às normas de segurança, deve se obstada a todo custo pelo risco que representa para a segurança orgânica de nossos aquartelamentos", completa o texto, em tom de alerta.