Título: Ex-prefeito pode ter Aécio pela frente em 2010
Autor: Carlos Marchi
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/04/2006, Nacional, p. A8

Se vencer eleição agora, Serra deve esbarrar no colega mineiro para disputar Presidência

O sonho presidencial que é a obsessão de José Serra e que esteve perto dele em 2002 deverá se tornar novamente seu alvo em 2010. Mas até lá ele deverá superar algumas etapas eliminatórias, a começar pela disputa do governo de São Paulo, em outubro. Se Serra perder, o sonho estará definitivamente arquivado; se vencer, alcançará um novo e revigorado patamar para reativar o sonho.

Mas a corrida de obstáculos pela Presidência começa difícil dentro do próprio partido de Serra, o PSDB. O maior obstáculo se chama Aécio Neves, o governador que traz no sangue a simbologia de Minas e a mística do avô Tancredo e que, se o mundo não desabar até outubro, deverá ser reeleito com uma votação consagradora no Estado. O que seria o segundo obstáculo - o ex-governador Geraldo Alckmin - por enquanto é uma incógnita.

Se perder as eleições para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Alckmin sai da fila. Se ganhar, deverá propor o fim da reeleição, cumprindo acordo feito com o triunvirato que o escolheu como pré-candidato do PSDB (o próprio Aécio, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o senador Tasso Jereissati, presidente do partido).

Quando ouve falar em Presidência, Aécio recorre imediatamente a suas duas frases preferidas a respeito, uma delas herdada do avô - "Presidência é destino" (a outra é "Não estou preocupado em ser presidente"). Jovem (45 anos), empenhado em bem governar, mas também em aproveitar a vida, ele confessa que sua expectativa política tem limites: "Não vou morrer se não for presidente", disse ele ao Estado na semana passada. "Posso fazer muitas outras coisas para ajudar o País."

Uma delas tem começo, meio e fim. Ele queria deixar o governo de Minas agora, no auge da estrondosa popularidade que os mineiros lhe dedicam (tem mais de 90% de "bom" e "ótimo") para concorrer ao Senado e, de Brasília, comandar as negociações para um novo pacto federativo, uma audaciosa reforma tributária e, de cambulhada, uma extensa reforma política. Mas seu projeto foi seccionado pelo próprio prestígio. Num manifesto, 747 dos 853 prefeitos mineiros, 19 do PT, pediram-lhe para ficar.

Na semana passada Aécio recebeu no Palácio das Mangabeiras uma caravana do PIB mineiro, integrada pelos presidentes de todas as grandes entidades empresariais do Estado. Eles não pediram que Aécio concorresse à reeleição - exigiram isto. E, depois de exigir, deixaram claro que a continuidade de seu governo é o degrau inferior da etapa a cumprir em 2010. Na ocasião, não faltou uma pregação contra o "poder paulista", que vai agora para o quarto mandato federal seguido.

Tranqüilamente sentado na sala de visitas do Palácio das Mangabeiras, em Belo Horizonte, ele diz que costuma rir com a ansiedade das outras pessoas sobre seu suposto projeto presidencial. Jura que não acalenta projeto nenhum e que - como todo mundo aposta - se um dia for presidente será porque "o destino" jogou-lhe o cargo no colo. "Minha maior dificuldade é explicar às pessoas que eu não compartilho da mesma ansiedade delas", brinca.

São dois comportamentos diametralmente opostos. Serra, pelo contrário, costuma afirmar que se preparou a vida inteira para ser presidente da República. Depois de perder a indicação presidencial, hesitou duas semanas para assumir a candidatura ao governo estadual, ajudar a manter a hegemonia tucana em São Paulo (que já dura 12 anos) e dar um palanque forte para Alckmin no Estado. A obsessão maior agora estará adiada por pelo menos mais quatro anos.

Nos últimos dias, Serra disse que se animou a disputar o governo do Estado porque vai encontrar as contas em ordem, muito dinheiro em caixa, bons projetos em gestação e uma perspectiva excelente para o desenvolvimento regional, o que lhe possibilitaria cumprir um governo eficiente.

Poderia incluir um outro item: se for governador de São Paulo, estará num patamar diferenciado para reerguer o sonho em 2010. Com uma pedra no sapato: dê Lula ou dê Alckmin, será o quarto mandato consecutivo de paulistas. Será que o povo brasileiro dos outros Estados concordará com isso?