Título: Uma estrutura de 24 mil jovens e 10 mil funcionários
Autor: Luciana Garbin
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/04/2006, Metrópole, p. C6

Só nos últimos seis anos, entre janeiro de 2000 e março deste ano, 83.740 adolescentes entraram na Febem. Sem contar as reincidências, o número é quase igual ao da população de Avaré. Não há número estimado de jovens atendidos nos 30 anos de fundação. Mas ninguém duvida de que o tempo só fez inchar as estatísticas.

No dia 20, a Febem abrigava em suas 75 unidades 5.900 garotos e 300 garotas de 12 a 21 anos. Contando infratores em semiliberdade ou em medidas de meio aberto, chega-se a 24 mil. João Benedito de Azevedo Marques, seu primeiro presidente, calcula que em sua época o total de infratores ficava em torno de mil. Mas as denúncias contra o serviço de atendimento a menores já existiam. E eram tão freqüentes que nos anos 70 notáveis, intelectuais, representantes do Judiciário e da Igreja pediam uma nova instituição. "A Pró-Menor, depois Febem, foi criada por pressão da sociedade civil", diz. "Queriam uma instituição independente, com autonomia financeira, que pudesse atravessar governos sem interferência política."

A realidade, porém, foi diferente. Quando Marques deixou a Febem, em 1977, ela tinha 2.500 funcionários - hoje são 9.800, além de 1.600 em licença médica. Os sucessivos governos foram inchando o quadro funcional, dividido em diversas correntes. Com o passar do tempo, a crise na instituição virou o calcanhar-de-aquiles dos governos em épocas de eleição.

Representante da Pastoral do Menor, o padre Júlio Lancellotti trabalhou por cinco anos como educador na Febem, justamente no início da instituição. Ele lembra que na época houve uma grande expansão de núcleos profissionalizantes na Febem, internos participavam de olimpíadas, estudavam com método educacional de ponta. E por que o problema se agravou? "Fora da Febem, muitas crianças continuavam fora da escola. Se não se trabalhar dentro e fora, os resultados são limitados", diz.

"Embora haja eventos conjunturais orientando políticas de atendimento à criança e ao adolescente, nota-se um fio condutor ao longo dos últimos cem anos", completa o professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), Roberto da Silva. Ele está, segundo Silva, ligado à intervenção do Estado na família pobre. "Nas ditas famílias estruturadas, há a medicalização dos comportamentos, por meio de médicos, terapeutas, psicólogos. Nas pobres, o que existe é criminalização e o tratamento se dá com polícia e Justiça."

Aos 48 anos, Silva não só estuda o tema como o viveu de perto. Passou à tutela do Estado em 1962, dois anos antes de o regime militar criar a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (Funabem). Passou por várias unidades, até deixá-las em junho de 1976, dois meses depois de a Pró-Menor, inspirada em moldes americanos, passar a se chamar Febem. "No âmbito da Guerra Fria, Brasil e Estados Unidos fizeram vários acordos. No pacote, veio o modelo de atendimento ao menor."