Título: Ex-interno hoje ajuda crianças
Autor: Luciana Garbin
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/04/2006, Metrópole, p. C6

Como educador e coordenador do Projeto Meninos e Meninas de Rua de São Bernardo do Campo, Marco Antonio da Silva, o Marquinhos, de 36 anos, voltou algumas vezes ao Complexo do Tatuapé. Mas nunca teve coragem de entrar na unidade 12, onde ficou meses internado. "Tenho lembranças ruins." Em sua época, rebeliões eram raras, mas o dia-a-dia já era um tormento. "O pessoal lá tá sempre medindo sua febre", diz, referindo-se ao temor de ser alvo de chacotas e agressões físicas, psicológicas e sexuais.

A maldade começava nas pegadinhas. Marquinhos lembra que havia um tapete onde ninguém deveria pisar. Os mais velhos pediam licença e o pulavam. Os novatos pisavam e recebiam castigos, como ter de lavar cuecas de outros garotos e sofrer agressões até sexuais. Em outra, garotos molhavam jornal com saliva e jogavam no teto. Se colasse, bem; se não, apanhava. Alguns monitores, conta, participavam dos passatempos sádicos pondo, por exemplo, os garotos "mais nervosos" para brigar. Também era praxe avisar quando chegava algum menino acusado de estupro. E se fazia vista grossa para o que acontecesse ao novo interno.

Já circulavam notícias de gangues, como Os Horrores, Os Metralhinhas e jovens ligados ao Serpentes Negras, do sistema carcerário. Mas tudo sutil. Nada como hoje, que se faz a reza do PCC. Mesmo assim, uma simples ida ao banheiro era difícil. "Os caras muitas vezes deixavam o moleque com a mão levantada para ele fazer nas calças."

Para Marquinhos, é preciso reconstruir a Febem mental, educacional e culturalmente.