Título: No discurso de defesa, ataques à imprensa
Autor: João Domingos
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/04/2006, Nacional, p. A6

João Paulo acusa os meios de comunicação de manipular a opinião pública

O deputado João Paulo Cunha (PT-SP) usou parte do tempo dedicado à sua defesa para atacar os meios de comunicação, os quais acusou de manipular a opinião pública. "Muitas vezes o jornal levanta uma tese, sustenta essa tese e depois transforma essa tese como se fosse opinião pública e pede no seu editorial o cumprimento daquela tese que é dele", disse.

A tática de atacar a opinião pública e os meios de comunicação foi usada por todos os parlamentares que responderam a processo de perda de mandato por envolvimento com o mensalão depois que o deputado Roberto Brant (PFL-MG) a adotou e saiu-se vitorioso. Como Brant - citado pelo petista -, João Paulo procurou fazer os deputados se sentirem feridos em seu amor próprio pelas críticas dos meios de comunicação às seguidas absolvições dos envolvidos com o mensalão.

Para João Paulo, a imprensa pode muito, mas não pode tudo. "A imprensa precisa entender que a opinião pública não é a opinião dos jornais. Se descuidarmos e levarmos isso até as últimas conseqüências, daqui a uns dias o povo não elege mais. Quem vai eleger é a opinião pública, os jornais. Mas e o povo?"

Ele comparou os meios de comunicação da época do Brasil Colônia, do Império, da Velha República e os de agora. Disse que antigamente havia os jornais pró-Brasil e pró-Portugal, os a favor e os contrários à monarquia, os que faziam campanha para um candidato a presidente e os que faziam para outro. Hoje, segundo João Paulo, isso não acontece.

"Hoje, o método é grave, porque se faz opção política pelo editorial e pelas matérias, mas não se assume. Faz-se opção por determinada política e não se mostra. É ruim isso. Diferentemente, insisto, de outros países, em que a imprensa atua claramente, o editorial é de determinada linha, os temas são enfrentados em diversas linhas."

João Paulo citou o escritor uruguaio Eduardo Galeano para falar daquilo que, segundo ele, é o poder exagerado dos meios de comunicação: "Na periferia de Montevidéu, um advogado encontrou uma senhora presa por homicídio, chamada Alma de Agosto. Era cega, de paz. O advogado descobriu que ela descrevia todos os detalhes dos crimes com a frieza e a crueldade de um assassino contra suas vítimas".

"Como uma senhora cega, de idade, bondosa, tinha esse instinto de crueldade, dizendo que matou tantas pessoas assim? Depois foi ver que ela conseguiu inventar aquelas histórias a partir da tortura e da pressão psicológica, o que acabou por condená-la. Para surpresa do advogado, quando foi ao bairro onde ela morava, perguntou aos vizinhos quem era Alma. Eles responderam que ela era culpada. O advogado perguntou por que, e eles responderam que era o que os jornais diziam", contou.

Segundo João Paulo, essa história equivale a muitos momentos pelos quais os deputados passam. "Por mais que se tente repetir, reproduzir e demonstrar, na realidade ficamos absolutamente impotentes diante do grande mecanismo da imprensa."