Título: Renan enterra pedido de CPI para investigar Lula
Autor: Eugênia Lopes
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/04/2006, Nacional, p. A6

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), decidiu ontem arquivar o pedido de criação da CPI do Lula, contribuindo para esvaziar a crise política. O requerimento de abertura da comissão havia sido apresentado na semana passada pelo senador Almeida Lima (PMDB-SE), com a assinatura de 35 parlamentares.

O principal objetivo era investigar as relações entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente do Sebrae, Paulo Okamotto. Ex-caixa de campanha de Lula, Okamotto alega ter quitado com dinheiro próprio uma dívida de R$ 29,4 mil do presidente com o PT.

Para impedir o funcionamento da nova comissão, apelidada no Congresso de "CPI do Armagedon", Renan alegou que o requerimento não aponta um fato específico a ser investigado, como determina o regimento do Senado. Argumentou ainda que episódios listados no pedido estão sendo ou já foram investigados por outras comissões de inquérito.

"Para a constituição de CPI, o fato determinado é essencial. Listar fatos difusos, desconexos ou pulverizados, outros apenas genéricos e imprecisos, na tentativa de viabilizar sua instalação, não encontra respaldo na Constituição nem nos regimentos das Casas Legislativas e menos ainda no Supremo Tribunal Federal(STF)", alegou o presidente do Senado.

O requerimento apresentado por Almeida Lima listava cinco casos a serem apurados pela CPI, num prazo de seis meses. Além da relação entre Lula e Okamotto, o requerimento recomendava a investigação dos negócios de um dos filhos do presidente, Fábio Luís Lula da Silva. A Gamecorp, empresa de jogos eletrônicos da qual Lulinha é sócio, recebeu investimentos de R$ 5 milhões da empresa de telefonia Telemar.

Almeida Lima também propunha apurar a origem e o destino dos dólares encontrados na cueca de uma assessor do deputado estadual José Nobre Guimarães (PT-CE), irmão do ex-presidente do PT José Genoino. Outra investigação proposta é sobre a suposta participação de parentes de Lula - entre eles, seu irmão Genival Inácio da Silva, o Vavá - na intermediação de interesses de empresas em estatais e órgãos públicos. Por fim, Almeida Lima queria esclarecer a violação da conta bancária do caseiro Francenildo dos Santos Costa, o Nildo, que em entrevista ao Estado desmentiu o ministro Antonio Palocci e terminou alvo de uma devassa.

No seu despacho, Renan destacou: "A superposição ou redundância nas investigações maculam uma das maiores conquistas da Constituição de 1998, cujo instrumento nos deu poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, o que não pode ser confundido com o procedimento persecutório ou manejado para objetivos outros, inclusive inquisitoriais."

Almeida Lima está em viagem oficial à Áustria e não foi encontrado para comentar a decisão de Renan. Apenas a senadora Heloísa Helena (PSOL-AL) contestou a derrubada do requerimento. "Quando coloquei a minha assinatura, é porque tenho a interpretação de que há fato determinado", reclamou. Os demais líderes de oposição não se manifestaram.

Ainda para justificar a medida, Renan citou decisão tomada em 1996, durante o governo Fernando Henrique Cardoso. Na ocasião, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado determinou o arquivamento da CPI dos Bancos com o argumento de que não havia "objetivo preciso" no pedido. No despacho, Renan lembrou que o Senado instalou, só no ano passado, três comissões de inquérito mistas, além da CPI dos Bingos.

"Nunca se investigou tanto. Os pedidos continham fato determinado, prazo de funcionamento e o terço constitucional necessário", argumentou. "Como presidente, dei todo o apoio logístico e político para que trabalhassem com autonomia e independência. Portanto, em nenhuma dessas oportunidades foi suprimido ou violado o direito de a minoria investigar."