Título: Justiça manda quebrar sigilo de entidades da Via Campesina
Autor: Elder Ogliari
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/04/2006, Nacional, p. A10

O juiz José Pedro Eckert, de Barra do Ribeiro (RS), autorizou ontem a quebra de sigilo bancário de três entidades ligadas à Via Campesina que participaram da depredação de um viveiro de mudas e um laboratório da Aracruz Celulose em 8 de março. Também acolheu denúncia do Ministério Público e abriu processo contra 37 pessoas acusadas como líderes do ataque às instalações da empresa, entre os quais o coordenador nacional do Movimento dos Sem-Terra (MST), João Pedro Stédile, e quatro estrangeiros.

A denúncia e o pedido de quebra do sigilo foram apresentados pelo promotor Daniel Indrusiak na segunda-feira. Ele segue investigando o caso e quer saber a origem dos recursos que financiam as atividades dos movimentos ligados à Via Campesina.

Agora o promotor pode ter acesso às contas de três associações: a Nacional de Mulheres Camponeses, a das Mulheres Trabalhadoras Rurais da Região Sul e a das Mulheres Trabalhadoras Rurais no Rio Grande do Sul. Nesta última, a investigação policial achou cheques assinados em branco e quantias em dinheiro vivo - R$ 17 mil, US$ 6 mil, 7 mil pesos chilenos e 9 quetzales guatemaltecos.

REAÇÃO

A Via Campesina do Rio Grande do Sul considera que a denúncia de Indrusiak está "baseada em suposições" e "não tem base jurídica". Em nota distribuída ontem, a organização reafirma sua disposição de lutar contra a monocultura do eucalipto. E faz uma previsão, ao afirmar que "a ação das mulheres da Via Campesina, realizada no Dia Internacional da Mulher, será um marco para as futuras gerações na defesa da vida na Terra".

Além de qualificar as denúncias de "infundadas", a nota diz que elas respondem às pressões dos meios de comunicação interessados no patrocínio de empresas como a Aracruz. Também sugere que o Judiciário "se paute mais pelo interesse público do que pela pressão de grandes empresas e da imprensa". Pede ainda que o Ministério Público mostre a mesma agilidade para apurar agressões a índios, quilombolas, camponeses e ao meio ambiente que a Aracruz estaria cometendo em Minas, Espírito Santo e Bahia. E destaca que a empresa será julgada pelo Tribunal Internacional dos Povos, organizado pela sociedade civil, entre 10 e 13 de maio, em Viena.

A Via Campesina anexou à nota abaixo-assinado mundial de apoio às mulheres que atacaram a Aracruz. Em forma de versos, diz que havia um silêncio sepulcral, intransponível e promíscuo sobre problemas ambientais e sociais causados pela indústria, quando "milhares de mulheres se juntaram e destruíram mudas (de árvores), a opressão e a mentira".

Indrusiak disse que avalia hoje se vai comentar as acusações da Via Campesina. A assessoria da Aracruz Celulose informou que a empresa só se manifestará no momento que julgar oportuno.

BAHIA

Em Salvador, 400 manifestantes de 11 entidades sociais rurais e urbanas da Bahia desocuparam a Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia (Conder) e acamparam ontem na sede do Sindicato dos Bancários, à espera de negociações com representantes dos governos estadual e federal. O grupo resolveu sair da Conder anteontem à noite para evitar um confronto com a Polícia Militar.

No interior, as entidades continuaram a interditar estradas. A rodovia BR-242 voltou a ter o trânsito bloqueado no trecho do município de Ibotirama. Também ocorreu interdição na BR-324, na altura de Capim Grosso.

O grupo pede terras, crédito agrícola, habitação e melhoria de estradas, entre 350 reivindicações. Seus líderes avisaram que só pretendem encerrar as manifestações se receberem garantias do atendimento dos pedidos.