Título: Professores são poucos, ganham pouco e sabem pouco, diz Unesco
Autor: Lisandra Paraguassú
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/04/2006, Vida&, p. A16

O Brasil vai precisar de mais 396 mil professores até 2015 para manter o atendimento nas escolas de ensino básico - a reposição de profissionais é o primeiro passo para garantir a universalização. Mas o desafio é ainda maior: qualificar a maioria dos professores que está trabalhando hoje e investir mais.

O relatório "Educação para Todos 2006 - Professores e Educação de Qualidade", lançado ontem pela Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura, mostra que o Brasil é, na América Latina, um dos países com menor grau de formação de seus professores.

Segundo o levantamento, os professores de 1ª a 4ª série (92%) têm apenas o magistério - definido pela Unesco como ensino médio completo mais um ou dois anos de estudo. Apenas Nicarágua e Panamá, entre os países da América Latina que dispõem de dados, estão na mesma situação que o Brasil. A Argentina, por exemplo, tem 67% dos seus professores do primário com ensino superior. No Chile, são 92%.

A pesquisa afirma que o nível de qualificação dos professores cresce em todo o mundo, inclusive no Brasil. Porém, faz uma ressalva: coloca o País, junto com Indonésia e Egito, entre os que precisam fazer grandes esforços para garantir que todos os professores primários tenham ensino superior.

Formar esses professores para melhorar o acesso e a qualidade das escolas será, de acordo com a Unesco, o maior desafio brasileiro. O País continua entre os países com maiores taxas de repetência do mundo - 21%, igual à da Eritréia e de Moçambique, maior que a de Ruanda e Lesoto. Essa é uma das razões para o Brasil ter de contratar mais 396 mil professores nos próximos dez anos.

O número de alunos no ensino básico vem diminuindo, assim como a quantidade de crianças em idade escolar, por causa da desaceleração do crescimento vegetativo. No entanto, como a taxa de repetência ainda é alta, essa redução não acontece na velocidade que poderia. "A repetência reflete más condições de ensino e aprendizagem e aumenta a pressão sobre os professores e sobre os recursos nacionais", diz o relatório.

O estudo mostra, ainda, que os salários dos professores também estão entre os problemas brasileiros. Quando comparado com outros 11 países da América Latina e Caribe que têm dados nacionais, o Brasil não está mal: tem o quarto maior salário anual, de 8.780 dólares PPP (dólar Paridade de Poder de Compra, na sigla em inglês, uma medida que permite a comparação entre diferentes moedas). Mas perde de longe para o México, País que tem economia semelhante (veja quadro ao lado).

DESESTÍMULO É justamente o salário que faz com que professores tenham de dar aulas de manhã até à noite, sem tempo para reciclagem, nem estímulo para continuar. "Você é humilhada, xingada, ouve de aluno que ele vai te pegar, que vai até sua casa se não conseguir os resultados que quer. Eu, hoje, penso como os alcoólicos anônimos, um dia de cada vez. Digo toda manhã: só por hoje conseguirei dar todas as minhas aulas", desabafa a professora Fátima Regina de Souza, de 51 anos. De segunda a sexta-feira, ela começa a trabalhar às 7h15. E só termina às 23 horas.

"Estudei seis anos, me formei em Letras e faço cursos de atualização aos sábados. Tenho de trabalhar tudo isso para conseguir um salário um pouco melhor. Mas chego na escola e não posso nem tirar xerox para propor uma atividade diferente."