Título: O trabalho é árduo, mas 'a firma' é uma família
Autor: Angela Lacerda
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/04/2006, Economia & Negócios, p. B10

Gilmar Guida de Souza, 29 anos, orgulha-se de ter transportado o primeiro carregamento de minério de ferro até Juazeirinho. Também foi ele que trouxe, de Caxias, no Rio Grande do Sul, o primeiro rodotrem até Jucurutu. "Só Deus sabe como fiz aquela viagem. Nem sabia da existência de um veículo tão grande, só conhecia o bitrem."

Contratado pela Toniolo Busnelllo, ele diz que sua vida mudou: "Aprendi sobre ética, respeito, estou mais organizado em casa." Grato pela oportunidade - "nunca que eu tinha chance de pegar um emprego desse" - ele não esquece que na semana em que foi contratado, teve passagem paga para São Paulo e estadia, para enterrar o filho mais velho, que morava com a mãe e morreu aos 11 anos. Ele devolveu o dinheiro em prestações, mas não esquece: "Eles confiam em mim."

Gilmar ainda se admira por ser tratado como um igual. "Minha vida é isso aqui", afirma apontando a mina. Ele contou que seu Arno (Arno Busnello,diretor da Toniolo) mandou climatizar as caçambas para reduzir o calor - ele mesmo dirigiu o veículo até à serra para saber as condições de trabalho. "Ele voltou ensopado de suor e disse que ninguém podia agüentar aquela temperatura (cerca de 45 graus centígrados)."

João Batista dos Santos, 29 anos, encarregado de campo, trabalha em um constante corre-corre, das 7 horas até às 15h30 de segunda a sábado. Os pais são de Jucurutu, mas moram em Açu, nas redondezas. Desempregado e com o curso de contabilidade, há dois anos e meio ele foi passar uns dias com parentes em Mutamba, pequeno e pobre povoado de Jucurutu. Ajudou o pessoal que chegou para estudar a mina e nunca mais saiu de lá. "Fiz um pouco de tudo", contou. Uma espécie de curinga, João garantiu que a seleção dos funcionários não foi moleza. "É um trabalho árduo, pesado, mas o povo está acostumado à labuta, à aridez."

Há apenas seis mulheres contratadas na mina. Franciélia Guedes da Silva, 27 anos, trabalha no controle de qualidade do produto, que acompanha as amostras da mina, do carregamento e produção. Técnica em Geologia e Mineração, terminou o curso e voltou ao sertão, de onde saíra para estudar. Está na empresa desde outubro de 2004, quando o único acesso à mina era através de picadas abertas por bodes e cabras. Treinou em Minas Gerais e divide a casa alugada pela empresa com mais duas moças: Fabiana Maria da Silva Oliveira, tecnóloga em controle ambiental, e Simone Gomes da Silva, auxiliar do laboratório químico.

Elias Costa Gomes, 56 anos, encarregado do escritório, é funcionário da Toniolo há 20 anos. Veio do Rio Grande do Sul há um ano e ainda não se adaptou: "Isto aqui é totalmente atípico. Não há opção, não há diversão." Ele estranha a comida, o calor e o cenário árido do período de estiagem. Mesmo agora, época chuvosa, em que toda a vegetação está verde, às 5 horas o dia está claro. Às 7, o sol queima. Recentemente ele descobriu as "gargalheiras", açudes que formam praias. "O lugar é lindo e o banho maravilhoso."