Título: Itália entre Prodi e Berlusconi
Autor: Reali Júnior
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/04/2006, Internacional, p. A20,21

Após campanha de baixo nível, país decide hoje e amanhã entre candidato de centro-esquerda e de centro-direita

Cerca de 50 milhões de eleitores que devem votar hoje e amanhã nas eleições legislativas italianas terão a incumbência de confirmar ou mudar a maioria parlamentar na Câmara dos Deputados e no Senado, provocando, no caso de uma vitória da coligação de centro-esquerda liderada por Romano Prodi, a queda do governo de centro-direita de Silvio Berlusconi, no poder nesses cinco últimos anos.

Como as pesquisas de intenção de voto foram suspensas duas semanas antes da votação, qualquer previsão se torna ainda mais difícil, mas Berlusconi admitiu, pela primeira vez na véspera do encerramento da campanha, a hipótese de uma eventual derrota.

Essa campanha eleitoral não deverá deixar muita saudade aos eleitores, que não viam a hora de seu encerramento, diante da degeneração política na fase final, com a troca de golpes baixos, insultos, palavrões, acusações, e a multiplicação de gafes entre os adversários. Esses fatos pouco contribuíram para aumentar a credibilidade da democracia italiana, num momento delicado da vida econômica e política deste país.

Três cenários estão sendo previstos:

1) Uma vitória de Prodi deverá ter como conseqüência imediata a formação de um governo disposto a aplicar um drástico plano de recuperação financeira para relançar a economia do país, fortemente abalada por um crescimento zero nesses últimos dois anos.

Para manter a unidade de sua coligação, o professor Prodi não deve perder tempo, mostrando sua capacidade de formar, rapidamente, um governo que deverá ter um perfil europeu, como ele mesmo prometeu no comício de encerramento de sua campanha, na sexta-feira, quando fez uma profissão de fé européia. Isso não será fácil diante de forças heterogêneas que formam a coligação que ele lidera, do centro à extrema esquerda. Outra missão urgente será o início de um processo de pacificação da vida política do país. "Pretendo dirigir um governo de todos os italianos", declarou Prodi em seu último discurso de campanha.

2) A segunda hipótese consistiria numa vitória pessoal do primeiro-ministro Silvio Berlusconi, renovando, por mais cinco anos, seu mandato. Suas numerosas promessas seriam imediatamente cobradas pelo eleitor, incluindo as que tratam da supressão de impostos e taxas, o que pouco contribuiria para a melhora de uma das economias mais enfermas de toda a União Européia.

Além disso, esse será um resultado desastroso para uma democracia baseada na alternância, como é o caso da vivida por seus vizinhos europeus. Berlusconi não teria condições de governar em guerra com alguns setores que ele criticou durante toda a campanha, como a magistratura e o grande empresariado italiano - os homens da Confindustria. No plano regional, a Comissão Européia sempre apoiou a candidatura de Prodi, seu ex-presidente.

3) A terceira hipótese corresponde a um retrocesso, um resultado nulo provocado pela reforma eleitoral, uma lei fortemente contestada pela centro-esquerda e que poderá conduzir ao chamado "pareggio", ou seja, o empate entre as duas coalizões. O "pareggio" equivale a um resultado provocado por maiorias distintas na Câmara e no Senado.

Não se descarta a possibilidade de os italianos serem novamen te convocados às urnas em poucos meses para decidir o impasse, pois está afastada a hipótese de uma grande coalizão entre os dois principais grupos, seguindo o exemplo alemão.

O que também chama a atenção dos italianos é a sucessão do presidente Carlo Azeglio Ciampi que, aos 82 anos, não pretende mais permanecer na função após o término de seu mandato, em maio. Na Itália, o chefe de Estado é eleito pelos presidentes da Câmara e do Senado, após a escolha do novo Parlamento. Ciampi poderá ser substituído pelo ex-primeiro-ministro Giuliano Amato. Pelo menos esse é no nome mais citado até agora.