Título: Marqueteiros defendem descriminação das doações
Autor: Carlos Marchi
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/04/2006, Nacional, p. A4

Campanhas brasileiras seguem modelo que impõe a contratação de equipes grandes e profissionais caros

"Doar é legal" - este é o mote da campanha que o consultor José Roberto Berni gostaria de propor ao Tribunal Superior Eleitoral, como parte do esforço para normatizar as campanhas eleitorais no País. Segundo ele, doar recursos para campanha é uma iniciativa que hoje parece mais ligada ao Código Penal. "Temos de descriminar e incentivar a doação às campanhas como forma de fortalecer a democracia", diz ele.

Por certo, além de fortalecer a democracia, esse tipo de campanha melhoraria a vida dos consultores políticos, premidos agora pelo estreitamento do mercado. Mas serviria, também, para curar a insegurança dos candidatos, segundo Berni. Ele reconhece que uma campanha eleitoral custa caro.

Um candidato majoritário tem de apresentar dois programas diários de televisão e de rádio e mais 20 comerciais de 30 segundos veiculados durante o dia nas duas mídias. "É como se tivesse de produzir um Jornal Nacional por dia", observa Cila Schulman, que complementa: "Não se faz isso sem uma boa equipe e excelente estrutura de equipamentos."

Ricardo Carvalho concorda com ela. "Televisão deve ser feita por quem entende", diz. "E quem entende custa caro."

A estrutura de uma campanha não pode ser pequena. Além das equipes que desdobram a estratégia em ações diárias, os consultores devem dispor de bons profissionais de pesquisa para vasculhar gravações de rivais no passado.

Os programas eleitorais são distribuídos por emissoras geradoras, mas as fitas com os comerciais (ou spots) de 30 segundos programados para cada dia devem ser entregues diariamente em cada uma das emissoras de rádio e TV do Estado (ou do Brasil, no caso de campanhas presidenciais). A estrutura para a distribuição desse material deve ser providenciada pelo marqueteiro.

Algumas emissoras de rádio já recebem material por MP3, mas a imensa maioria ainda vive na idade da fita cassete - o que significa que a entrega tem de ser física, manual. E o número de destinatários não é pequeno: em todo o Brasil existem hoje 3.668 emissoras de rádio e, em algumas regiões, atingir certas cidades não é uma tarefa simples, mas uma aventura - como nos Estados do Norte.

As campanhas brasileiras gastam praticamente zero com contratação de mídia e carreiam todos os recursos para o esmero dos programas de televisão e pagamento de altos cachês aos profissionais contratados. Nos EUA, como a mídia das campanhas é paga, as maiores despesas são de veiculação, o que pressiona os outros custos para baixo.

No Brasil, os marqueteiros - ou consultores políticos, como eles preferem ser chamados - acabaram absorvendo todas as etapas de uma campanha, da elaboração de estratégia à produção de TV, da concepção visual ao discurso e textos políticos. Nos EUA, cada segmento tem especialistas, que são convocados pelo consultor principal para dar sua colaboração. Lá, a segmentação do trabalho acaba barateando a campanha.

Outra diferença é que lá as campanhas são moldadas à capacidade dos políticos de captar recursos. Aqui, os políticos não dizem ao consultor quanto têm para fazer a campanha. Eles preferem perguntar o custo estimado da mais espetacular campanha que poderia ser feita para catapultar sua candidatura e depois saem atrás do dinheiro. Foi esse desejo usual de ter sempre a campanha mais vistosa - que nem sempre é a mais inteligente e adequada - que universalizou o uso do caixa 2 entre os políticos brasileiros.